Forças Armadas e Democracia

Artigo publicado no Jornal do Commercio, Domingo, 22/01/2017, Caderno Opiniões, página 06.

José Maria Nóbrega Jr.

O ingresso das Forças Armadas (FFAA) no imbróglio do sistema penitenciário traz novamente à ordem do dia a discussão sobre o papel das Forças Armadas em democracias. Quais funções as FFAA teriam em democracias plenas? No Brasil é frequente o uso das FFAA para conter problemas internos.

A democracia moderna pode ser definida como uma forma de governo na qual os cidadãos têm a prerrogativa de produzir governos. No entanto, para o contexto latino-americano, é fundamental avaliar a qualidade da democracia tendo em vista o funcionamento de suas instituições coercitivas.
Em democracias plenas as FFAA têm papel restrito e a segurança interna fica sob controle estritamente civil. Quando há prerrogativas de políticas internas às FFAA tem-se aí o que Scott Mainwaring chamou de “espaços reservados”.

No Brasil, com a transição da ditadura para a democracia, a maioria das prerrogativas militares foi mantida. Os constituintes não conseguiram superar alguns entraves do regime anterior. O artigo 142 da CF/88 é um desses entraves.

As FFAA brasileiras, além da responsabilidade com as fronteiras e das missões de paz internacionais, têm a prerrogativa de garantes da lei e da ordem internas (art. 142 da CF/88). Foi justamente respaldado por este artigo que o Presidente Michel Temer decretou o seu uso nos presídios brasileiros. O ato foi constitucional, mas, para a teoria democrática contemporânea, trata-se de um espaço reservado de poder às FFAA.

O problema de nossa insegurança pública é muito mais complexo e o uso das FFAA apenas remedia a situação de falência do sistema penal, e ainda pode desgastar os militares perante a opinião pública. Por outro lado, fortalece politicamente a instituição em detrimento dos civis eleitos.

A constitucionalidade do uso das FFAA para questões de segurança interna macula a qualidade da democracia brasileira. Para uma democracia de alta intensidade institucional, este dispositivo constitucional deveria ser revisto para que as FFAA tivessem papel reduzido, ou até mesmo nulo, em questões de segurança interna. Como garantes dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem, as FFAA continuam a ser um poder de desequilíbrio interno.


José Maria Nóbrega Jr. é cientista político da Universidade Federal de Campina Grande, PB.

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