Extrema pobreza e violência na Paraíba: relação inversa



Por José Maria Nóbrega – cientista político e professor da UFCG.

Parte considerável da literatura das ciências sociais que estuda a violência como fenômeno social é praticamente unânime quanto à relação entre pobreza e violência. Os mais pobres são as vítimas principais da criminalidade, como também são os mais vulneráveis perante as instituições coercitivas. Existe muita comprovação empírica para esta tese, mas o que dizer da relação entre a situação de pobreza – medida pelo indicador de extrema pobreza[1] – com os níveis de violência – medidos pelos homicídios? O teste empírico mostra, muitas das vezes, uma intrigante relação inversa, ou seja, menos pobreza (ou menos pobres) e mais violência. Foi o que ocorreu na Paraíba.

Vejamos o teste empírico. Num simples cruzamento de dados numa série histórica de nove anos, de 2001 a 2009, utilizando os dados do IBGE no que se refere as estimativas populacionais e aos indicadores de extrema pobreza – este indicador em específico foi calculado em termos percentuais em relação à população jovem (15 a 24 anos) da Paraíba - e os dados do SIM/DATASUS resgatados em seus números absolutos de homicídios, e depois de calculadas as taxas e percentuais necessários para a comparação – o cálculo foi efetuado em torno da taxa da população total -, temos o seguinte resultado: quanto mais a pobreza como situação de vulnerabilidade diminui, mais os homicídios crescem como proxy de violência no Estado da Paraíba, como pode ser visto no gráfico abaixo.

Gráfico: Percentual de pessoas que vivem na extrema pobreza e taxas de homicídios por cem mil habitantes – Paraíba – 2001/2009




Fontes: IBGE/SIM/DATASUS. Gráfico formatado pelo autor, bem como cálculo das taxas de homicídios.

Observa-se, sobretudo, um momento de inflexão em 2005, quando os dados se cruzam em caminhos opostos (cf. gráfico). Os percentuais de pobreza caem e os indicadores de mortes por homicídio por cada grupo de cem mil habitantes crescem, mesmo que ainda estes de forma mais exponencial.

Um modelo de correlação simples nos dá a imagem desse fenômeno intrigante. A correlação entre ambos é de - 0,89 no teste de duas caldas[2]. Um nível muito alto de correlação inversa, pois o sinal é negativo demonstrando caminhos opostos, enquanto um cai o outro cresce.

Tabela. Taxa de homicídios por cem mil habitantes e percentual de pessoas na extrema pobreza na Paraíba – 2001/2009
Paraíba
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
tx homicidios
13,95
17,37
17,48
19,06
20,72
22,74
23,59
27,44
33,50
extrema pobreza
31,31
26,20
27,20
26,93
21,09
15,74
17,71
15,78
14,57
Correlação ext pob x hom
- 0,89 (2001/2009)
Fontes: IBGE/SIM/DATASUS. Tabela formatada pelo autor.

Dessa forma, afirmações cabais quanto à relação entre pobreza e violência devem ser feitas com cuidado, demonstrando o real impacto entre as variáveis estudadas. Apesar dos estudos empíricos demonstrarem que os pobres são os mais vitimados por homicídios, isso não quer dizer que a pobreza como situação econômica tenha a mesma relação. No caso da Paraíba, verificamos relação inversa entre uma e outra.





[1] O conceito de pobreza é de alta complexidade e não há consenso na área para uma definição do seu conceito. Para resolver em parte este impasse, o Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome publicou nota técnica sobre a situação econômica ou perfil da pobreza, ou extrema pobreza, no Brasil, segundo a realidade do censo de 2010. O IBGE, seguindo esta nota, desenvolveu um indicador de extrema pobreza onde aqueles que estiverem numa situação abaixo da linha de R$ 70,00 per capita de rendimento familiar se encontra em situação de vulnerabilidade ou miséria.
[2] Este teste mede o nível de correlação entre duas variáveis X e Y, quanto mais próximo de 1 maior o nível de relação, ou correlação entre as variáveis. O sinal indica o sentido da correlação. Neste caso, o sentido é inverso e o nível de significância é de quase - 0,9, ou seja, muito alto.

Comentários

Postagens mais visitadas