Prisões de homicidas: fator determinante para o controle dos assassinatos?


José Maria Nóbrega Jr. – Professor da UFCG/CDSA

Em outros trabalhos foi discutida a importância dos aprisionamentos para a redução da criminalidade (KHAN e ZANETIC, 2009). Especialistas da análise da violência e da segurança pública apontavam a relevância em se implementar prisões, mas não de caráter aleatório. Ou seja, as taxas de aprisionamentos só teria relação causal com a redução dos homicídios se fossem focadas em homicidas seriados. Com tal hipótese testada para o Estado de São Paulo, Tulio Khan e André Zanetic demonstraram que a relação entre aprisionamento de homicidas contumazes era significante para o controle dos homicídios em curto espaço de tempo (idem, 2009).
Analisando esta hipótese para o caso do Nordeste, Nóbrega Jr. (2011) testou as relações entre os dados de prisões e de homicídios, utilizando os dados do InfoPen (Banco de Dados do Sistema Penitenciário Nacional) e do SIM, e o que se verificou foi a baixa relação entre crescimento de prisões totais e controle da variável dependente de homicídios. Isso chamou atenção, pois na região Nordeste tanto os indicadores socioeconômicos – que foram apontados com forte relação em algumas análises de especialistas renomados (CERQUEIRA, LOBÃO e CARVALHO, 2007) – como os níveis de aprisionamento não tiveram o mesmo impacto quando testado em relação aos homicídios. No caso de indicadores socioeconômicos clássicos, como o índice de Gini e de renda domiciliar per capita, o nível de relação foi inverso. Ou seja, os indicadores melhoraram na distribuição de renda, mas os níveis de violência homicida seguiram na ascendente (NÓBREGA JR. e ZAVERUCHA, 2010).
Contudo, o teste não foi efetuado na sua relação entre homicídios perpetrados e o nível de aprisionamento de homicidas. Observando a realidade dos dados no Nordeste, verificou-se que os assassinatos permaneceram altos em uma dada série histórica (2000 a 2010, SIM). Salvo o Estado de Pernambuco que, principalmente nos últimos três anos da série histórica supra citada, passou a reverter seus dados de assassinatos. A variação percentual de Pernambuco foi negativa em -26,4% de 2008 a 2010, conforme tabela abaixo.

Tabela 1 Números absolutos de homicídios - diferença no período 2008/2010 - variação %
Região Nordeste
16729
18072
1343
7,43%
.. Maranhão
1239
1500
261
17,40%
.. Piauí
354
408
54
13,24%
.. Ceará
1954
2509
555
22,12%
.. Rio Grande do Norte
669
723
54
7,47%
.. Paraíba
1027
1452
425
29,27%
.. Pernambuco
4345
3436
-909
-26,46%
.. Alagoas
1878
2085
207
9,93%
.. Sergipe
554
675
121
17,93%
.. Bahia
4709
5284
575
10,88%
Fonte: Ministério da Saúde/Sistema de Informação de Mortalidade
IBGE CENSO 2010/Tabela formatada pelo autor
Retomando o raciocínio da hipótese levantada alhures, busco agora relacionar os números absolutos de homicídios e crimes violentos letais e intencionais (inserindo os latrocínios) com os níveis de aprisionamento de homicidas e latrocidas no Estado de Pernambuco. Neste Estado foi executado a partir de 2007 um plano de segurança específico, conhecido como Pacto pela Vida, e uma de suas principais metas era o robustecimento dos aprisionamentos de homicidas contumazes, o que poderia levar a uma redução dos homicídios em curto espaço de tempo[1].

Tabela 2. Crime Violento Letal Intencional, Prisões Totais, Prisões por Homicídio Qualificado, Prisões por Homicídio Simples, Prisões por Latrocínio e Prisões por CVLI (soma dos homicídios com Latrocínio)

Série hist
CVLI
PRI TOT
PRI HQ
PRI HS
PRI LAT
PRIS CVLI
2006
4470
15.778
1.071
407
672
2150
2007
4556
18.836
2869
1709
600
5178
2008
4345
19.808
2941
1956
647
5544
2009
3901
21.641
2244
2845
514
5603
2010
3443
23.925
3376
5688
540
9604
2011
-
25.850
2265
3869
521
6655
%
-23%
64%
111%
851%
-22%
208%

Fonte: Ministério da Justiça, InfoPen (2012); SIM (2012). Tabela formatada pelo autor

As prisões de homicídios simples teve incremento percentual de 1300% entre 2006 e 2010. Em 2006, o dado mostra o quantitativo de 407 prisões de homicidas simples naquele ano. Nos anos subsequentes as prisões cresceram expressivamente, alcançando um máximo de 5.688 presos no sistema acusados/condenados por homicídio simples em 2010. O crescimento de homicidas por homicídio qualificado também foi relevante, num nível de 215% entre 2006 e 2010. Já os dados de prisões por latrocínio sofreu uma redução (cf. tabela 2).




Tabela 3. Modelo de Correlação de Pearson – Variável dependente CVLI – Variáveis independentes Prisões Totais, Prisões por Homicídio Qualificado, Prisões por Homicídios Simples, Prisões por Latrocínio e Prisões de CVLI (soma de Prisões Totais, por Homicídio Qualificado, por Homicídio Simples e por Latrocínio)
Control Variables
PRI TOT
PRI HQ
PRI HS
PRI LAT
PRIS CVLI
CVLI
Correlation
,387
,652
-,532
,037
,047

Significance (2-tailed)
,613
,348
,468
,963
,953

df
2
2
2
2
2

Fonte: InfoPen | SIM. Modelo do autor.

Esses dados apresentaram nível alto de significância estatística em relação à redução dos homicídios em Pernambuco. O modelo de correlação de Pearson mostra que o empenho nesta variável teve a maior correlação entre as variáveis independentes testadas (prisões totais, prisões de homicídio qualificado, prisões de homicídios simples, prisões de latrocínio e prisões de CVLI – que seria a soma de todos os crimes que resultaram na morte da vítima (Cf. tabela 3). O sinal negativo na relação dos homicídios (CVLI) com as prisões de homicidas condenados por homicídio simples aponta para a correlação redutiva, ou seja, de redução nos números de CVLI. O nível de significância estatística das variáveis homicídio qualificado (HQ) e homicídio simples (HS) foi a maior de todas, com destaque para as prisões por homicídio simples. As prisões no agregado (total) e as prisões de CVLI (que insere os latrocínios) tiveram baixa significância estatística, o que reforça a nossa tese em outras análises.
Respondendo a questão que intitula este artigo: a prisão sem foco específico nos homicidas, não tem resultado satisfatório no controle dos homicídios. A prisão de homicida possui alto nível de significância estatística para a redução da violência homicida em curto espaço de tempo, o que nos permite afirmar que esta variável determina o sucesso da política pública de segurança em Pernambuco.

Bibliografia:
CERQUEIRA, Daniel; LOBÃO, Waldir; CARVALHO, Alexandre (2007). “O jogo dos sete mitos e a miséria da segurança pública no Brasil”. Homicídios no Brasil. Org. Marcus Vinicius Gonçalves da Cruz e Eduardo Batittuci. Ed. FGV. Rio de Janeiro.
KAHN, Tulio e ZANETIC, André (2009). “O papel dos municípios na segurança pública”. Coleção Segurança com Cidadania. Ano 1. Nº 1.
NÓBREGA JR., José Maria (2011). “Os Homicídios no Nordeste Brasileiro”. Panorama dos Homicídios no Brasil. Segurança, Justiça e Cidadania. Ano 3. Nº 6.
NÓBREGA JR., José Maria e ZAVERUCHA (2010). “Violência homicida no Nordeste brasileiro: uma refutação às explicações baseadas na desigualdade e na pobreza”. Dossiê Segurança Pública. Anuário Antropológico. Departamento de Antropologia da UnB. Tempo Brasileiro.







[1] A principal meta do Pacto pela Vida foi redução de 12% dos homicídios anualmente.

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