Distribuição de renda e sua relação com os homicídios no Nordeste

Por José Maria Nóbrega Jr. – Professor do CDSA/UFCG, Doutor em Ciência Política UFPE

INTRODUÇÃO

O Plano das Nações Unidas para a erradicação da pobreza tem na distribuição das riquezas um de seus focos principais. No Brasil, há preocupação dos governos nas três esferas da federação em implementar programas sociais e de estímulo ao trabalho que busquem diminuir as desigualdades sociais e de renda. O Programa Bolsa Família vem distribuindo renda nas mais diversas regiões do país com grande impacto na melhoria da vida das pessoas, principalmente daquelas que estão em situação crítica de pobreza (NÓBREGA JR e ZAVERUCHA, 2010). Neste espaço analiso qual a relação da melhoria da condição de vida das pessoas no Nordeste com o nível de violência na região. Para tal, utilizo variáveis socioeconômicas para mensurar esta relação.
Economicamente o indicador de coeficiente de Gini da população economicamente ativa é uma importante variável socioeconômica que mede tanto a dimensão da desigualdade como a expressão da pobreza de determinado grupo social. De outro lado, o principal indicador que mede violência, principalmente em grandes regiões, são os números de homicídios. Dessa forma, sem delongas teóricas, vou fazer um teste estatístico bivariado (que mede a correlação entre duas variáveis) para medir o real impacto da distribuição ou concentração de renda, com os homicídios no Nordeste no período de 2001 a 2008.

MODELO ESTATÍSTICO

O modelo estatístico a ser utilizado é uma Correlação de Pearson bivariada. Neste modelo a variável dependente é representada pelas taxas de homicídios entre os anos de 2001 e 2008. Os dados secundários (números absolutos de homicídios e população) foram resgatados do IBGE (2012), suas estimativas populacionais do período em questão (série histórica), e do SIM/DATASUS, números absolutos de todas as “mortes por agressão” (codificadas na CID 10 entre X85-Y09)[1].
A variável independente é o Índice de Gini das pessoas ocupadas com rendimento mensal de trabalho (IBGE) para o mesmo período (2001-2008). O indicador de Gini é uma medida entre 0 e 1. Quanto mais perto de 0 menor a desigualdade de renda, quanto mais perto de 1 maior a desigualdade.
O coeficiente de correlação de Pearson mede o grau de correlação e direção da correlação, se é positiva ou negativa, entre duas variáveis X e Y.
Sendo assim, X = Taxas de Homicídios no Nordeste e Y = Índice de Gini no Nordeste.
A análise correlacional indica a relação entre 2 variáveis lineares e os valores sempre serão entre +1 e -1. O sinal indica a direção, se a correlação é positiva ou negativa, e o tamanho da variável indica a força da correlação.
As taxas de homicídios são calculadas da seguinte forma:
TxH ne = pop ne / nhom ne = p ne x 100.000
Onde, Tx H ne é a taxa de homicídios no Nordeste; pop ne é a população total nordestina; nhom ne  são os números absolutos de homicídios; e p ne é o resultado da divisão.

RESULTADOS

O coeficiente indicador de Gini mede o grau de concentração ou desconcentração de renda da população economicamente ativa. Quanto mais o nível deste indicador se aproxima de 0 menor a concentração de renda, ou seja, está havendo distribuição de renda. As taxas de homicídios representam o nível de violência, quando o número é crescente, a violência está descontrolada.
Tabela 1. Índice de Gini – Pessoas ocupadas com rendimento mensal de trabalho | Taxas de homicídios | Região Nordeste | 2001 – 2008

S. hist.
GINI
TX HOM
2001
0,576
21,92
2002
0,574
22,45
2003
0,564
24,03
2004
0,569
23,23
2005
0,557
25,45
2006
0,565
27,93
2007
0,547
29,57
2008
0,546
31,51
Fonte: IBGE/SIM/DATASUS. Cálculo das taxas de homicídios Nóbrega Jr. (2012)
Tabela formatada pelo autor
Na tabela 1 observa-se que o índice de Gini vem sofrendo uma paulatina, mas gradual, diminuição na série histórica em análise, ou seja, está havendo maior distribuição da renda. Já no que tange as taxas de homicídios, medida que leva em consideração a estimativa populacional da região, estas são crescentes apresentando, a priori, uma relação inversa das duas variáveis (X = taxas de homicídios e Y = índice de Gini). Esta discussão vem ilustrada nos gráficos 1 e 2 abaixo:
Gráfico 1. Índice de Gini – pessoas ocupadas com rendimento mensal de trabalho
Nordeste – 2001 a 2008

Fonte: IBGE (2012)
Gráfico 2. Taxas de homicídios – Nordeste – 2001 a 2008

Fontes: SIM/DATASUS. Cálculo das taxas de homicídios NÓBREGA JR. (2012).

Aplicando o modelo de Correlação de Pearson, o resultado aparece sumarizado na tabela abaixo:

Tabela 2. Modelo de Correlação Bivariada ou de Pearson



TX HOM
GINI
TX HOM
Pearson Correlation
1
-,908**
Sig. (2-tailed)

,002
N
8
8
**. Correlation is significant at the 0.01 level (2-tailed).
Modelo feito no SPSS 17, autoria NÓBREGA JR. (2012)

A relação negativa (-,908**) demonstra relação inversa entre menos desigualdade e mais violência. Economicamente as pessoas no Nordeste estão tendo maior acesso à renda, mas a violência, medida pelas taxas de homicídio, cresce. O nível da correlação é alto. Ou seja, mais renda e menor segurança individual, este é o real impacto das duas variáveis em questão.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NÓBREGA JR. José Maria e ZAVERUCHA Jorge (2010), Violência homicida no nordeste brasileiro: uma refutação às explicações baseadas na desigualdade e na pobreza. Anuário Antropológico 2009 II. Dossiê Segurança Pública. Editora Tempo Brasileiro. DF.
NÓBREGA JR. José Maria (2010), A dinâmica dos homicídios no Nordeste e em Pernambuco. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social - Vol. 3 - no 10 - OUT/NOV/DEZ 2010 - pp. 51-74



[1] Para uma explicação sobre a metodologia desse banco de dados ler NÓBREGA JR. (2010), “A dinâmica dos homicídios no Nordeste e em Pernambuco”, DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social - Vol. 3 - no 10 - OUT/NOV/DEZ 2010 - pp. 51-74.

Comentários

  1. Interessante o estudo...até porque parece ir contra a teoria geral de que a violência urbana no Brasil é, necessariamente, vinculada à questão da concentração de renda. Mas o senhor não acha que o crescimento econômico verificado nos últimos anos no Nordeste não veio acompanhado de planejamento urbano, infra-estrutua de transporte, comunicação, estradas e até mesmo da questão judiciária, ou seja, há minúsculos municípios em que há dificuldade até em se achar comarcas...

    O que o senhor acha?

    Um abraço e parabéns pelo trabalho!

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  2. Caro José Maria, me parece um caso de aplicação de estatística sem um planejamento experimental adequado. Isso nos leva à conlusões errôneas sobre correlações. E nesse caso é uma afirmação perigosa, que poderia até levar alguém a achar a desigualdade "inofensiva".
    O correto neste caso seria comparar regiões ou países, como neste estudo empírico do Banco Mundial: http://siteresources.worldbank.org/DEC/Resources/Crime%26Inequality.pdf
    Para o estudo que você se propôs a fazer, a variação de Gini não é significativa. Ou seja, ele não explica o aumento da violência. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, mesmo aparentemente apresentando uma correlação. Poderia aplicar o mesmo método estatístico e achar uma correlação positiva entre a altura do meu filho ao longo dos seus primeiros 10 anos e a distância do cometa Halley em relação ao planeta Terra - e certamente uma coisa não tem nada a ver com outra.
    Saudações,
    Roberto.

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