Faroeste caboclo


Paulo Rossi


paulorossi.df@dabr.com.br

correio braziliense 25 agosto 2010

Vivi parte de minha infância, nos anos 70, na SQN 107. A quadra tinha apenas quatro blocos cinzentos. Eu “descia” quase todas as tardes para jogar bola de gude e futebol ou andar de bicicleta. Estudava na Escola Classe da 102 e muitas vezes fazia o percurso a pé. Tempos de tranquilidade, sempre na rua, ao ar livre. A Asa Norte era uma amplidão de cerrado, salpicada por escassos edifícios residenciais.



Hoje moro na 703 Norte. E vivo preocupado. Ao filho mais velho, de 17 anos, imploro para só andar nas redondezas à luz do dia e acompanhado por amigos. À caçula, de 10 anos, que até três meses atrás voltava da escola caminhando com a empregada, baixei a ordem para ser conduzida de carro por meus vizinhos.



O bairro das boas lembranças é coisa do passado. A sequência de crimes amedronta moradores e comerciantes. O caso mais recente, no último sábado, estarreceu a comunidade da 710 Norte. Sebastião Carneiro de Souza, 52 anos, o Tião da padaria, tentou impedir que um amigo fosse assaltado por adolescentes. Morreu com um tiro na cabeça.



Reportagem de Saulo Araújo, publicada ontem no caderno de Cidades do Correio, mostra que Tião temia o pior. “A gente trabalha com medo, pois a marginalidade está muito grande”, afirmara o comerciante em 6 de agosto, acrescentando já ter sido assaltado sete vezes. Ele não contou com a mesma sorte que o casal de adolescentes alvejado em 10 de julho, na 706 Norte. Os jovens sobreviveram sem sequelas.



O sentimento de impotência vai minando a qualidade de vida do brasiliense. Os vários postos policiais espalhados pelas superquadras não intimidam os bandidos, pois os agentes pouco saem às ruas. O efetivo de 360 PMs, segundo a própria corporação, é insuficiente para proteger os cerca de 100 mil habitantes da Asa Norte.



A morte de Sebastião de Souza escancarou ainda mais a porta de outro grave problema do DF. O Hospital de Base, para onde o comerciante foi levado, não tinha aparelho de tomografia. Um terço dos tomógrafos da rede hospitalar — três de um total de nove — está inoperante.



Para completar o quadro sombrio, os três adolescentes envolvidos na morte de Sebastião eram reincidentes e haviam sido beneficiados com um “saidão”. A quantidade de crimes praticados por jovens e a impunidade fazem a população atacar o Estatuto da Criança e do Adolescente.



Brasília está doente. Desde o escândalo da Caixa de Pandora, a sensação é de que habitamos uma cidade acéfala, desgovernada. Resta à população procurar abrigo em meio à escuridão de uma terra sem lei.

Obs.: HOJE O DISTRITO FEDERAL TEM A MAIOR TAXA DE HOMICÍDIOS DO PAÍS = 31,6
O NORDESTE = 31,5

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