Mortes Violentas Intencionais no Brasil (2012/2024)

 Por José Maria P. da Nóbrega Júnior - coordenador do Núcleo de Estudos da Violência, da Criminalidade e da Qualidade Democrática (NEVCrim/UFCG/CNPq)

 


A Morte Violenta Intencional (MVI)corresponde a soma de todas as mortes provocadas intencionalmente por terceiros, sendo elas: homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte (são os Crimes Violentos Letais e Intencionais - CVLI), policiais civis e militares vítimas de CVLI e morte decorrente de intervenção policial.

O novo Anuário Brasileiro de Segurança Pública foi lançado no dia 24 de julho de 2025 e trouxe novos dados a respeito do cenário brasileiro da criminalidade, da violência e da segurança pública. No geral, houve melhoria nas condições de segurança pública no Brasil, mas não se pode comemorar demais sobre o assunto, pois os dados ainda são preocupantes e a violência descontrolada na maior parte do país. 

Gráfico 01: Taxa de Mortes Violentas Intencionais (por 100 mil habitantes) - Brasil e Regiões (2024)

Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

No gráfico 01 temos: a taxa média de MVIs no Brasil foi de 20,8/100 mil, com queda de 5,4% em relação a 2023, que teve a taxa de 21,9. O Nordeste é a região mais violenta do país e concentra as dez cidades mais violentas do Brasil (conforme podemos ver na tabela 01). A taxa de 33,8 por cem mil é bem superior a média nacional e mais que o dobro das regiões sul e sudeste, com taxas de 14,6 e 13,3 respectivamente.

As regiões norte e nordeste absorvem grandes conflitos entre facções criminosas, com destaque ao estado da Bahia. Das dez cidades mais violentas do Brasil - todas cidades com populações iguais ou superiores aos cem mil habitantes - cinco são baianas, conforme podemos ver na tabela abaixo:

Tabela 01: Ranking dos dez municípios com maiores taxas de Mortes Violentas Intencionais em 2024 (cidades com população igual ou superior a 100 mil habitantes)

Posição

Município

UF

Mortes Violentas Intencionais

Taxa

N. Abs.

1

Maranguape

CE

79,9

87

2

Jequié

BA

77,6

131

3

Juazeiro

BA

76,2

194

4

Camaçari

BA

74,8

239

5

Cabo de Santo Agostinho

PE

73,3

159

6

São Lourenço da Mata

PE

73,0

86

7

Simões Filho

BA

71,4

86

8

Caucaia

CE

68,7

258

9

Maracanaú

CE

68,5

171

10

Feira de Santana

BA

65,2

429

Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

A tendência dos dados de MVIs no Brasil é de queda, como podemos verificar na linha de tendência do gráfico abaixo:

Gráfico 02: Taxas de MVIs no Brasil - 2012/2024

Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

Mas, é interessante averiguarmos os períodos separadamente:

Tabela 02: Variações percentuais nos períodos do gráfico 02

VAR. % 12/24

VAR. % 17/24

VAR. % 12/17

VAR. %17/19

-25

-34

13

-26

Cálculos efetuados pelo autor

No período inteiro, 2012/2024, a queda foi de -25%, mas a queda é mais acentuada entre 2017 e 2024, na ordem de -34%. Destacar que a taxa pico se deu em 2017, com 30,2/100 mil. Entre 2012 e 2017, no entanto, tivemos crescimento de 13% nas taxas de MVIs. Os anos de 2017 a 2019 apresentaram uma inflexão importante no período, na ordem de -26% em curto período, o que foi importante para os anos posteriores.

A região nordeste, como já dito, é a mais violenta e vamos analisá-la separadamente.

Gráfico 03: Taxas de MVIs - Nordeste - 2012/2024

Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

No gráfico acima, a tendência de queda em todo o período é visível na linha tracejada (linha de tendência). No entanto, entre 2012 e 2017 há crescimento importante, com o pico em 2017 em que a taxa alcançou o dado de 49 MVIs por cem mil habitantes quando, no Brasil, a taxa foi de 31,2 conforme podemos ver no gráfico 02. A queda brusca de 2017 a 2019 não foi bem explicada ainda, mas já efetuamos estudos que mostram ações importantes da gestão da segurança pública nos estados nordestinos que, apesar da sobrecarga da criminalidade, efetuaram importantes políticas de contenção da violência (NÓBREGA JR.; NÓBREGA, 2022). Entre 2019 e 2024 há crescimento, mas o comportamento dos dados apresenta em sua trajetória maior tendência de queda do que de crescimento, interessantemente.

O melhor das variações podemos ver na tabela abaixo:

Tabela 03: Variações percentuais nos períodos do gráfico 03

VAR. % 12/24

VAR. % 17/24

VAR. % 12/17

VAR. % 17/19

-11

-31

28

-34

Cálculos efetuados pelo autor

 

No período inteiro, houve queda de -11% entre 2012 e 2024. No entanto, entre 2012 e 2017 houve crescimento nas taxas na ordem de 28%. Entre 2017 e 2024, a queda foi de -31% com destaque aos anos de 2017 a 2019, que foi de -34% o que reforça o nosso argumento em publicação de 2022 (NÓBREGA JR.; NÓBREGA, 2022).

As facções criminosas respondem por boa parte desses números no Nordeste. Como já dito, das dez cidades mais violentas, cinco são na Bahia, estado com o maior número de facções registradas no seu sistema carcerário. Os conflitos nas periferias potencializa, também, as mortes decorrentes de intervenção policial (MDIP).

Por exemplo, das MVIs registradas em Jequié, 33,6% foi de mortes decorrentes de intervenção policial. Das 131 MVIs ocorridas na cidade, 44 foram de MDIP. A taxa da cidade foi de 77,6/100 mil.

Do outro lado, a região sudeste foi a menos violenta. Com destaque a São Paulo que apresentou a menor taxa de MVIs das regiões do país, com 8,2/100 mil, ainda assim um pequeno aumento em relação ao ano anterior.

Vejamos os dados das taxas de São Paulo:

Gráfico 04: Taxas MVIs - São Paulo - 2012/2024

Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

 

Os dados apontam para redução de 44% em todo o período, sem anos acentuados de crescimento como vimos, por exemplo, entre 2019 e 2020 no Nordeste. A linha de tendência é acentuada, sendo um estado com decréscimo em todos os períodos. Apesar de claramente ser um estado que vem apresentando números reduzidos em suas taxas, a violência letal policial aumentou bastante entre 2023 e 2024 saltando de um percentual de 14,5% em 2023, para 21,7% do total de MVIs.

Concluindo, há muito o que avançarmos em nossa política de contenção da criminalidade violenta no país, a começar pelo controle das organizações criminosas (as facções do tipo Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital e as facções corruptas dentro do próprio Estado). Há importantes dados a serem analisados do novo Anuário em destaque, mas o desafio do controle das facções criminosas se apresenta como o maior de todos. Vimos que a Bahia está em estado crítico, lá há 21 facções criminosas em seu sistema carcerário, disparado o maior número do Brasil. Do outro lado, temos São Paulo, com praticamente o PCC como sendo hegemônico no estado. Essa hegemonia diminui os conflitos, mas não a criminalidade que se tornou menos violenta, mas não menos criminosa e mais desafiadora, pois coopta agentes estatais com o seu poderio econômico.

 

REFERÊNCIAS:

 

NÓBREGA JÚNIOR, José Maria Pereira da.;NÓBREGA, Duilia Dalyana Ribeiro Santos da. Morte matada: a dinâmica dos homicídios no nordeste. Campina Grande : EDUEPB, 2022.

 

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