A democracia do Brasil em risco
A democracia do Brasil em risco
José Maria Nóbrega - cientista político, professor da UFCG
É assim que está o título do texto sobre o Brasil no documento da The Economist em seu relatório do Democracy Index recentemente lançado. “Brazil’s democracy at risk”, com ênfase na queda de seis pontos do índice médio de regime político do país no último ano de dados consolidados, 2024. Desde 2014 o indicador do Brasil vem caindo, nos últimos anos, com mais ênfase. Dentre muitos problemas, a The Economist cita a censura promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A imposição do ministro Alexandre de Moraes em torno da suspensão do X e das pesadas multas às empresas de Elon Musk também foram citadas como fatores de censura prévia e de forte politização da corte.
O processo de deterioração da democracia está fortemente associado a perda de liberdade de expressão e de opinião. Analisando os dados do World Justice Project (2024) numa mesma série histórica em seu indicador “As liberdades de expressão e de opinião são efetivas” no índice de estado de direito (rule of law index) houve uma queda de 28,37% neste índice, enquanto a queda na qualidade da democracia foi de -12,05%. A correlação entre as duas séries temporais foi de 0,75, uma forte associação.
Enquanto os nossos ministros do STF “brincam” de censores, a democracia não está sendo salva - como eles e parte da imprensa propagam -, pelo contrário, está se deteriorando, em risco de retrocesso a um regime autoritário. O Brasil nunca foi classificado entre as democracias sólidas, sempre estando entre os regimes de democracias falhas. Mas, o indicador de 6,49 do último ano da série (o pior de toda a série histórica) colocou o Brasil na 57ª, caindo seis pontos em relação a 2023.
Gráfico. Democracia e Liberdades de expressão e opinião - Brasil - 2014/2024
Fontes: Democracy Index (2024) / World Justice Project (2024); rule of law index.
Não é uma questão de posicionamento político - esquerda ou direita - é fato público e notório. A liberdade de se manisfestar politicamente está sendo cerceada pelas instituições que deveriam garantir as liberdades civis e políticas. O STF, que deveria proteger os direitos dos cidadãos, está cerceando e ferindo a Constituição de 1988 em seu artigo quinto, quando as decisões de seus magistrados perseguem quem não faz parte da ideologia do governo.
A democracia corre sério risco quando os seus juízes decidem com base em ideologias e não no que é justo, na Constituição e nas leis. Juízes que discursam contra determinada corrente política não são imparciais para julgar. Medindo o mesmo índice de democracia com os níveis de imparcialidade da justiça criminal, temos mais outra forte associação. O nível de imparcialidade do poder judiciário para julgar crimes, inclusive os de opinião, caiu ao pior nível de todos os tempos. O Brasil hoje está empatado em último lugar com Venezuela (país autoritário) no índice de imparcialidade da justiça criminal.
Isso motiva partidos de esquerda a tentar criminalizar a opinião da direita. Há um sério risco de se criticar o governo e o STF tomar as dores e abrir um inquérito para investigar possíveis “discursos de ódio da extrema-direita”, como foi visto no discurso proferido por Alexandre de Moraes recentemente aos calouros do curso de direito da USP, quando ele afirmou que o STF vai perseguir aqueles que eles considerarem “fascistas, nazistas e extremistas da direita”.
Isso é muito grave e coloca numa situação de risco autoritário, não dos tradicionais golpes de estado do passado, com baionetas e coturnos, mas com as canetas dos magistrados. Não podemos esquecer o que o outro ministro do STF, Luis Roberto Barroso, afirmou em evento da UNE há uns dois anos: ter vencido o bolsonarismo nas últimas eleições presidenciais, em 2022. Com a clara interferência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na disputa daquele pleito, ajudando o partido do atual presidente ao retirar várias postagens consideradas por eles como sendo “fake news”.
A democracia brasileira está em risco e um dos principais riscos vem justamente das instituições e dos atores políticos que deveriam garantir a Constituição. Moraes, Barroso, Dino, Mendes, Toffoli etc. não possuem as credenciais da imparcialidade para julgar os "golpistas" do oito de janeiro e, muito menos, o ex-presidente Bolsonaro.
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