A fake news do ex-ministro da Justiça

Jorge Zaverucha é Doutor em Ciência Política pela Universidade de Chicago e Professor Titular da UFPE.

[publicado em O PODER, 14/8/23]

Um ex-ministro da Justiça da ex-presidente Dilma Rousseff costuma, durante programa de debates na CNN, disseminar um sério equívoco ou se preferirem fake news. Atenção STF. Ela afirma que estudos científicos atestam que quanto maior for o número de armas em circulação mais cresceria a cifra de homicídios.

Provavelmente, refere-se a estudos realizados nos EUA. De fato, por lá há mais pesquisas que apontam para a causalidade mais armas mais crimes. Contudo, há outros estudos sérios que são divergentes. A disputa científica continua e não há consenso.

No caso brasileiro é fácil mostrar o argumento falacioso do ex-ministro. Durante o governo Bolsonaro nunca circularam tantas armas legais no país e o índice de homicídios em vez de subir, caiu. Sem contar as inúmeras armas ilegais que podem ser compradas em qualquer feira de troca-troca e que adentram pela “peneira” de nossas fronteiras. No Rio, boa parte do número de homicídios depende da decisão dos traficantes e/ou milícias agirem ou ficarem quietos. Atuam, predominantemente, com armas ilegais e de grosso calibre. Infelizmente, isto não é devidamente ressaltado pelo ex-ministro, nem pelas ONGs que tratam do tema. O atual ministro da Justiça e Segurança Pública, também, sabe disto. Surgem as chamadas narrativas. Como a discussão tornou-se ideológica, não convém informar a verdade ao público brasileiro 

Isto não significa dizer ser válido outro tipo de causalidade: menos armas leva a menor número de homicídios. Trata-se de outra narrativa infundada. 

Mesmo no período logo após o Estatuto do Desarmamento quando houve um determinado período de queda no número de mortes, já se sabia que a causalidade entre maior circulação de armas e menos mortes não procedia. No período citado acima, a queda teve muito a ver com a significativa performance de São Paulo, o mais populoso estado brasileiro e detentor da melhor polícia nacional. Contudo, no Nordeste, o número de homicídios subia. Cada região com suas peculiaridades e o número de homicídios não pode ser explicado, unicamente, pelo número de armas existentes. Em síntese, o homicídio é um complexo fenômeno multicausal. Assim sendo, contempla vários fatores da qual a arma de fogo é, tão somente, uma delas. Chega de narrativas.