Um dos fatores fundamentais para o controle da violência é a capacidade do Estado em seu monopólio da força. Conceito weberiano importante, o monopólio da violência legal é um dos principais atributos do Estado Moderno. Surge em paralelo ao capitalismo e tem nas garantias ao direito de propriedade uma de suas características. O monopólio da força é o principal vetor para a civilidade. Sem ele, o que temos é o estado de guerra de todos contra todos.
Os homicídios são a principal variável para avaliação da violência. O cálculo de suas taxas por cem mil habitantes revela o nível de violência social e se o Estado é capaz de controlá-la. A taxa média mundial é de 6,2 homicídios por cem mil habitantes. As Américas são as regiões mais violentas do mundo, com destaque à América Latina, e a Europa se destaca pelas baixas taxas de violência homicida.
O homicídio é um crime violento que atenta contra o principal ingrediente dos direitos de propriedade, o direito à vida. É um elemento de desmobilização social os altos números de violência homicida.
Para o seu controle, além das políticas públicas sociais de melhoria dos níveis de desigualdades sociais, é fundamental a accountability das instituições do aparato coercitivo estatal, começando pelas polícias, passando pelo promotoria de justiça, pelo judiciário e pelo sistema correcional. O baixo accountability dessas instituições levam a sociedade a uma armadilha social na qual a falta de confiança interpessoal leva a uma falta de cooperação entre os atores sociais e as instituições responsáveis pela garantia da lei e da ordem.
Os dados de violência medidos pelas taxas de homicídios revelam o nível de civilidade das sociedades. Na Europa, como podemos ver na tabela abaixo, os níveis de violência homicida são baixíssimos, na ordem de 0,5 homicídios por cem mil habitantes e que está associado aos níveis de democracia e aos níveis de justiça criminal. As médias são muito superiores em qualidade aos dados da tabela logo a seguir dos dados da América Latina.
A média das democracias europeias é de 8,6, ou seja, classificadas segundo o Democracy Index como democracias cheias ou consolidadas e a média de justiça criminal, que diz respeito ao funcionamento das instituições coercitivas, foi de 0,7 conforme a mensuração do WJP no seu Rule Of Law Index, classificando a maioria dos países em análise como de alta capacidade do aparato coercitivo.
Na América Latina, o risco de morrer assassinado é 15 vezes superior a média dos países europeus. O processo civilizador de Norbert Elias sofreu um grande recuo no continente. Acompanha níveis de regimes semidemocráticos, com a média de 6,9 no indicador de democracia, e com a média baixa do nível dos aparatos coercitivos responsáveis pela accountatility do sistema de justiça criminal.
No Brasil, a violência cresce desde finais dos anos setenta. Como pode ser visto no gráfico acima, houve mais de um milhão e quinhentos mil homicídios no país entre 1979 e 2018. A variação percentual foi de quase 400% no período. O que motivou este processo de recuo civilizatório no Brasil foi a incapacidade das suas instituições coercitivas.
O Instituto Sou da Paz criou um indicador de impunidade interessante para avaliar os níveis de esclarecimento de homicídios no Brasil. O Índice Nacional de Esclarecimento de Homicídios (INEH), avalia qual a proporção dos homicídios dolosos que resultou em ações de responsabilização (accountability) do sistema judiciário brasileiro em cada unidade federativa (estados e Distrito Federal). O indicador segue os níveis percentuais de resolução dos homicídios, da seguinte forma:
Os indicadores regionais no mundo são:
No Brasil, a última média foi de 37%, portanto, de média eficácia segundo os parâmetros do INEH. Dos vinte e seis mais o Distrito Federal, sete deles não tiveram o indicador compilado por falta de informações completas. A unidade federativa que apresentou o melhor indicador de INEH foi Rondônia com 90% de esclarecimento e o pior foi o Rio de Janeiro com indicador de esclarecimento de homicídios de 16%.
Para avaliarmos o impacto dos dados, fizemos uma correlação entre matrizes de dados e o resultado apontou que há uma correlação de moderada a alta entre o INEH e as taxas de homicídios. Ou seja, é relevante o trabalho das instituições no intuito de resolver os crimes violentos de homicídios dolosos, que é a maioria dos homicídios.
A tabela acima demonstra a correlação negativa entre os dois conjuntos de dados. Isto quer dizer que quanto maior o nível de esclarecimento dos homicídios menor é a tendência dos homicídios crescerem. Portanto, investir na capacidade estatal das instituições responsáveis pelo monopólio da violência legal é fundamental para o crescimento da accountability e, por sua vez, da qualidade das democracias e do processo civilizador.
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