Crime organizado e democracia
Crime organizado e democracia
Por José Maria Nóbrega – cientista
político e professor universitário
O crime organizado pode ser
definido como um grupo estruturado, com atuação mínima de três pessoas, que age
contra uma ordem legal, que pratica lavagem de dinheiro, corrompe agentes do Estado
e que tem as suas atividades se estendendo para além das fronteiras do
território nacional.
Democracia é um regime político
que promove eleições livres e limpas para os poderes Executivo e Legislativo,
no qual há garantias institucionais dos direitos civis e políticos dos eleitores-cidadãos,
que o exercício do poder é limitado pelas instituições (checks and balances)
e no qual as forças de segurança estão sob controle civil, ou seja, dos que
foram eleitos pelo eleitor-cidadão.
O crime organizado pode limitar o
andamento da democracia, corrompendo-a. Quando o crime organizado chega a
instâncias de poder, a democracia tem dificuldades de se consolidar, ou seja, de
se solidificar como regime político (apesar de manter o jogo eleitoral).
Para o preenchimento de todos os
seus requisitos, sobretudo no que tange ao exercício controlado do poder, é
necessário, para a democracia, o controle do crime organizado. Este pode chegar
a patamares muito elevados, corrompendo o sistema de freios e contrapesos
característicos das repúblicas democráticas contemporâneas.
A Operação Lava-Jato, com os seus
vícios e virtudes, nos revelou um grave esquema de corrupção e roubalheira
praticado por políticos, empresários e partidos políticos (com destaque ao Partido
dos Trabalhadores) que se enquadra perfeitamente no conceito de crime
organizado aqui descrito.
Havia um esquema muito claro que pretendia
manter uma estrutura de poder na qual dificilmente haveria a alternância no
âmbito da escolha eleitoral. A intenção da quadrilha era se manter no poder
cooptando políticos e empresários, o que fere diretamente o conceito de
democracia descrito no segundo parágrafo deste texto. A lisura das eleições e a
garantia dos direitos civis e políticos simplesmente seriam letra morta, com o
enquadramento das instituições de representação de justiça nas mãos dos criminosos.
O ex-presidente Lula e muitos de
seus séquitos foram presos nesta Operação, onde o ex-mandatário da Nação passou
quinhentos e oitenta dias preso na sede da Polícia Federal em Curitiba;
condenado por vários tipos penais que se encaixam na definição de crime
organizado que definimos acima.
Houve relaxamento da sua pena
tendo como base da sua defesa a falta de imparcialidade do ex-juiz Sérgio Moro
(ex-ministro de Bolsonaro e hoje pré-candidato a Presidente) levando o Supremo Tribunal
Federal a anular todas as condenações (em duas instâncias, diga-se de passagem)
para que o processo de acusação do Lula, e de outros condenados da dita Operação,
voltasse ao início para novo julgamento, agora, segundo o STF, com a devida imparcialidade.
Sem entrar no mérito jurídico da
tomada de decisão do STF, o que foi passado para boa parte da sociedade brasileira
é que crimes praticados por quem tem poder não são levados em conta pelas
instituições de julgamento.
O Brasil é um país com alto
índice de impunidade, conforme dados do Global Impunity Index. Numa escala
de classificação na qual o país é classificado em quatro categorias, o Brasil
foi diagnosticado como um país de altíssima impunidade (Countries with a
Higher Impunity Index), ou seja, a pior entre as quatro escalas. Não à toa,
o crime organizado seja algo tão lucrativo no país. O custo de investir no
crime parece ser pequeno em relação ao benefício esperado pelos quadrilheiros.
Com altos índices de impunidade,
o país também apresenta níveis muito altos de violência e de corrupção.
Ambiente fértil para a proliferação de grupos criminosos organizados dos mais
diversos.
No caso específico dos partidos
políticos, temos o pior nível de confiança nos partidos de todos os países
latino-americanos, segundo pesquisa efetuada pelo instituto Latinobarómetro.
Os partidos políticos, principais plataformas de representação da democracia
contemporânea, se apresentam como pouco críveis aos eleitores-cidadãos brasileiros.
Não é de admirar, que boa parte
do eleitorado brasileiro tem verdadeira ojeriza ao Partido dos Trabalhadores.
Concluindo, há incompatibilidade
entre crime organizado e democracia. Quanto maior um, menor o outro. A correlação
é inversa. Para melhorarmos o nível de nossa democracia, temos que combater o
crime organizado. Mas, o que as nossas instituições coercitivas estão fazendo é
justamente o contrário.
Temos hoje um pré-candidato a
Presidência da República chefe de quadrilha. Que agora pede, conforme
reportagem da Revista Veja recente, que o eleitor esqueça o passado (dele e do
PT) e lance olhos para o futuro.
O que eu vejo, é um futuro com
mais crime organizado e menos democracia caso esse cenário triste de vitória do
PT seja confirmado.
Comentários
Postar um comentário