Democracia insatisfatória
José Roberto Toledo
21
Abril 2016 | 04h 05
A
insatisfação com a democracia nunca foi tão grande no Brasil – pelo menos desde
2008, quando o Ibope começou a medi-la. Pesquisa inédita do instituto e
publicada com exclusividade pela coluna mostra que 49% dos brasileiros se dizem
“nada satisfeitos” com o funcionamento da democracia no Brasil. Somam-se a eles
outros 34% que se dizem “pouco satisfeitos”.
Só
14% afirmaram ao Ibope estar “satisfeitos” (12%) ou “muito satisfeitos” (2%)
com o regime democrático. O resto não quis ou não soube responder. O recorde
negativo anterior era de 2015, com 45% de “nada satisfeitos”. Os 49% de
insatisfação atuais com a democracia são especialmente altos quando comparados
aos 13% de 2010 ou mesmo aos 22% de 2014. A pesquisa foi feita entre os dias 14
e 18 de abril.
A
insatisfação é maior no Sudeste (52%), entre quem completou só o ensino
Fundamental (58%), nas cidades de médio porte (55%), nas periferias das
metrópoles (52%) e entre evangélicos (53%). Não há diferença significativa por
faixa de renda nem entre eleitores que votaram em Dilma Rousseff ou Aécio
Neves.
Como
consequência da insatisfação, o apoio à democracia entre os brasileiros também
é o mais baixo em quase uma década. Só 40% concordaram com a frase “a
democracia é preferível a qualquer outra forma de governo”. A concordância com
essa afirmação chegou a ser de 55% em 2009. Caíra desde então, até 46% em 2014.
Em
contrapartida à nova queda da preferência pelo regime democrático, cresceram os
indiferentes. Pularam de 18% em 2014 para 34% em 2016 os que concordam com a
frase “para as pessoas em geral, dá na mesma se um regime é democrático ou
não”.
A
única boa notícia da pesquisa é que a fatia dos simpatizantes com o
totalitarismo diminuiu. A concordância com a frase “em algumas circunstâncias,
um governo autoritário pode ser preferível a um governo democrático” nunca foi
tão baixa: 15% agora, contra 20% em 2014. Antes disso, oscilava de 18% a 19%.
Os
resultados sugerem que Eduardo Cunha tem mais impacto negativo sobre a
democracia do que Jair Bolsonaro. Enquanto este se limita a uma fatia cadente
da população, o outro é capaz de espalhar o descrédito do sistema entre o dobro
de brasileiros.
Cunha
provou que o seu jeito de fazer política compensa. O Supremo não tem data para
julgá-lo. A Comissão de Ética não consegue votar nada contra ele. E, enquanto
colhe elogios dos colegas mais assanhados, dá folga aos deputados e chantageia
os senadores com o trancamento da pauta legislativa até votarem o que ele quer
quando ele quiser. Sem medo de nada ou de ninguém, provoca excitação em
ex-presidiários que não tiveram a mesma astúcia e, talvez por isso,
considerem-no seu vilão preferido.
A
impunibilidade de Eduardo Cunha é a prova definitiva de que o sistema político
brasileiro visa o interesse exclusivo de seus atores. Quanto mais protagonista
é no elenco, mais impunível o parlamentar se torna. O exemplo que ele consolida
a cada nova artimanha não será esquecido jamais por essa geração. E servirá de
inspiração para quem vier a substituí-lo. Ser Cunha compensa.
Não
importam novas denúncias, tampouco pesam as repetidas manipulações do regimento
da Câmara. Sua imagem é a de que não há juiz, policial, parlamentar ou
presidente que possa com ele. Mesmo que o STF, num acesso de coragem, marque o
julgamento de Cunha pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva
para amanhã, o precedente que ele estabeleceu é permanente.
Todos
os deputados que elogiaram as qualidade de Cunha antes, durante e depois da
votação do impeachment de Dilma são um testemunho de que o homem pode passar,
mas seu estilo ficará.
Colocados
lado a lado, o sucesso de Cunha e a pesquisa do Ibope sugerem que, quando é boa
demais para os políticos, a democracia à brasileira é insatisfatória para todos
os demais interessados.
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