Violência no Cariri paraibano: diagnosticando o perfil da vítima e trazendo novas perspectivas para a segurança pública
José
Maria Nóbrega Jr. – cientista político, professor da UFCG/CDSA, coordenador do
NEVU (Núcleo de Estudos da Violência da UFCG)
A violência vem grassando a
vida de muitos cidadãos brasileiros. No último ano de registro, 2012, foram
mais de cinquenta e cinco mil pessoas assassinadas no país, o que resultou numa
taxa de homicídios superior a quase três vezes o tolerável, ou seja, 29 pessoas
foram assassinadas no Brasil por cada grupo de cem mil habitantes para um nível
de tolerância de 10 por cem mil. Uma verdadeira epidemia, segundo os dados do
SIM/DATASUS (Sistema de Informação de Mortalidade do Sistema de dados do
Sistema Único de Saúde), que computa todos os dados de causas mortis da CID,
Classificação Internacional de Doenças. Os homicídios no Brasil matam mais que
o vírus do ebola na África. Dentro deste contexto, o Nordeste é a região mais
representativa. Com mais de vinte mil assassinatos registrados em 2012, possui
uma taxa de 39 homicídios por cem mil habitantes, superando países que estão em
guerra declarada. Neste diapasão, a Paraíba é representativa. Entre 2000 e
2012, a diferença percentual foi superior aos 200% e as taxas por cem mil
saltaram em 171% no período. Em 2000, a taxa foi de 14,7 homicídios por cem mil
habitantes paraibanos, chegando em 2012 ao número expressivo de 40/100 mil.
Neste Estado nordestino o processo não se deu apenas nas maiores cidades. O
interior viu um processo de crescimento da violência nunca visto antes. O
Cariri, região do semiárido paraibano, sofreu impacto significativo. É nesta
microrregião que concentro agora a minha análise.
Os
dados que se seguem foram resgatados da pesquisa de Iniciação Científica
(PIBIC) recém-finda, executada pela estudante do curso de Ciências Sociais do
Centro de Humanidades, Campus de Campina Grande, Elizabeth Karla Guedes de
Carvalho. Por mim orientada no âmbito do CDSA. O título da pesquisa “A
VIOLÊNCIA NO CARIRI PARAIBANO: UMA ANÁLISE EMPÍRICA DA CRIMINALIDADE HOMICIDA”.
Fazendo um levantamento dos
dados de homicídios em doze cidades do Cariri paraibano, selecionadas
aleatoriamente, em doze anos, municípíos como Sumé e Monteiro – que possuem as
maiores populações da região - apresentaram níveis elevados de assassinatos. No
somatório do período 2000 a 2012, Sumé teve 28 assassinatos perpetrados em seu
território. Monteiro ficou em primeiro lugar com 43 assassinatos e São João do
Tigre, apesar de uma população de pouco mais de quatro mil habitantes, teve 11
assassinatos em doze anos.
Os mais vitimados são jovens
entre 15 e 30 anos, tendo, também, um quantitativo expressivo de pessoas
adultas, com mais de trinta e menos de cinquenta anos, incluso nessa
estatística da morte violenta.
Os dados mostram que a
maioria dessas vítimas tem baixo nível de escolaridade, o que aponta para uma
maior envergadura da variável educação
como elemento de controle da violência. Analisando o perfil por esta variável,
no período 2000 a 2012, destacando as cidades de Sumé, Monteiro e Livramento,
percebemos a forte relação entre o nível de escolaridade e números absolutos de
homicídios. Com exceção da cidade de Monteiro, cem por cento das vítimas de
homicídio tiveram menos de 12 anos de escolaridade. Em Sumé, foram assassinadas
9 pessoas, e onde se teve registro, todas com menos de 12 anos de escolaridade.
Em Livramento, a chance de pessoas com menos de 12 anos de escolaridade ser
assassinada também é bem maior. Foram assassinadas 5 pessoas durante 12 anos. E
não é diferente na cidade de Monteiro que teve 12 vitimas com escolaridade inferior
aos 12 anos de escolaridade e apenas duas vitimas com escolaridade igual ou
superior aos 12 anos. Podemos concluir que o nível de escolaridade influencia nos
assassinatos, pois quanto menos anos de escolaridade maior as chances de ser
vitima de homicídio.
Outro dado importante diz
respeito à violência de gênero. A maior parte das vítimas é do sexo masculino,
contudo, os homicídios praticados contra as pessoas do sexo feminino pode-se
dizer que é alarmante. A média nacional de homicídios do sexo feminino é de 4
homicídios por cem mil habitantes. No Cariri este dado supera a média nacional.
As mulheres estão sofrendo com a violência, a taxa em Serra Branca, por exemplo,
foi de quase 15/100 mil, em 2012. Foi uma mulher assassinada numa cidade de
pequeno porte. Uma morte violenta em cidade de pequeno porte eleva muito a
taxa. Contudo, em Sumé tivemos um assassinato de uma jovem de forma covarde e
desumana nos últimos dias, o que nos leva à reflexão desse fenômeno: o
feminicídio. O controle desta variável é possível, sobretudo pelo tamanho do
município e pela tarefa de conscientização que os prefeitos podem alavancar em
termos de região.
A maior parte das vítimas é
solteira e da cor da pele parda. Mas, o que podemos destacar é o nível de
homicídios praticados por arma de fogo. A média nacional é de 70% das vítimas
de homicídios. Contudo, a Paraíba apresenta nível maior de mortes por agressão
praticadas por arma de fogo. O percentual foi de 85,4%. No Cariri o percentual
foi de 66,7% de homicídios praticados com arma de fogo e 22% praticados com
objeto perfuro-cortante. Duas observações os dados nos permitem fazer: a
primeira, a facilidade de se obter arma de fogo no Estado da Paraíba. A
segunda, no Cariri muitas mortes desse tipo foram perpetradas por arma branca
(perfuro cortante). Isto nos indica a importância das apreensões de armas, não
só de fogo, como uma das tarefas a ser praticada pelas polícias da região.
O perfil da vítima demonstra
uma tendência, apesar de algumas peculiaridades regionais. Mas, segue que a
maioria delas é do sexo masculino, tem entre 15 e 30 anos de idade, é da cor da
pela parda, de baixo nível de escolaridade, solteira e foi alvejada por arma de
fogo. Somente com este perfil o gestor da segurança pública pode, em parceria
com outras áreas setoriais, implantar modelos de prevenção bem sucedidos,
sobretudo em nível de municípios.
Para concluir, mostra-se
relevante a discussão da segurança pública no âmbito da comunidade.
Recentemente, uma moça da Cidade de Sumé foi estuprada e assassinada no
município, o que gerou revolta por parte da população. Os órgãos constituídos,
Legislativo, Executivo e Judiciário pouco se manifestaram a respeito. É hora de
levar a discussão da segurança pública para o âmbito municipal. Isso já foi
feito há mais de dez anos em países como a Colômbia e os Estados Unidos e,
também, em alguns municípios de maior porte do Brasil. Urge a presença dos
poderes constituídos no interior do Nordeste, em específico na Paraíba, para
discutir, em conjunto com a sociedade e a comunidade acadêmica, novas políticas
públicas para os municípios da região do Cariri paraibano e de outras regiões
que, como o Cariri da Paraíba, vem sofrendo com a criminalidade, a violência e
a delinquência juvenil.
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