A lacuna proporcionada pelo Sistema Carcerário


José Maria Nóbrega Jr. – cientista político e professor da UFCG(PB)



As instituições coercitivas responsáveis pela garantia dos direitos civis são formadas por peças e engrenagens que precisam funcionar adequadamente. Além das polícias e da justiça, o sistema carcerário/penal necessita de administração moderna e de um modelo claro de proposta para a recondução, ou não, do indivíduo condenado à sociedade. O que temos hoje no Brasil é um modelo perto da falência. Os dados nos sugerem esta afirmação.

Segundo os dados resgatados pelo Depen/Infopen (Departamento de Informação do Sistema Penitenciário Brasileiro) e tabulados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2013), em 2012 tínhamos um total de 549.786 presos no sistema carcerário brasileiro, dos quais 34.304 deles estavam sob custódia das polícias. Entre 2011 e 2012 houve crescimento percentual de 16,6% nos números absolutos de pessoas presas, já que em 2011 este dado foi de 471.254 indivíduos dentro do sistema. O Brasil aparece entre os primeiros do ranking em apreensões/aprisionamentos, como uma sociedade que “prende bastante” pessoas, mas, pelo que parece, de forma inadequada e sem políticas públicas de ressocialização e de readequação dos indivíduos presos.

As vagas no sistema nacional penitenciário são deficitárias. Enquanto o percentual de crescimento de presos foi de 16,6% entre 2011 e 2012, o percentual de crescimento de vagas não chegou aos 3%, foram 2,8% de crescimento numa realidade de superlotação. Em 2011, eram 295.413 vagas disponíveis para mais de 470 mil pessoas presas. Em 2012, foram disponibilizadas 303.741 vagas para uma população carcerária acima dos 540 mil detentos. Ou seja, um déficit de mais de 200 mil vagas.

Neste quadro, Pernambuco apresentou um déficit de mais de 17 mil vagas em 2012. Enquanto sua população carcerária cresceu na ordem de 11,2% entre 2011 e 2012, no mesmo período foram disponibilizadas mais 8,6% de vagas num sistema extremamente deficitário. A política de aprisionamento em Pernambuco cresceu na ordem de 64% entre 2006 e 2011. No que tange ao controle dos homicídios, o incremento percentual de prisões foi altíssimo: 111% de condenados por homicídio qualificado e 720% em relação aos condenados por homicídio simples, no mesmo período. Por outro lado, o sistema prisional não avançou num ritmo adequado ao incremento das prisões, dessa forma, entrando em colapso. Para os 28.769 detentos encontrados no sistema carcerário pernambucano, o Estado só disponibiliza 11.478 vagas em 2012. Ou seja, um déficit de 17.291 vagas.

Segundo Adorno e Salla (2007), é na lacuna deixada pelo estado dentro do sistema carcerário que o crime organizado encontra sua principal motivação. Superlotação, corrupção e desorganização administrativa resultam em distúrbios, rebeliões e práticas de crimes fora dos muros das prisões, mas comandadas por detentos de dentro do sistema. O Primeiro Comando da Capital (PCC) surgiu dessa lacuna e se apresenta como o maior exemplo da falência encontrada dentro do sistema penitenciário brasileiro.

Outro exemplo de fracasso do sistema foram os mais de sessenta assassinatos ocorridos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas no ano passado, no Estado do Maranhão – conforme os dados  do Sistema de Informação de Mortalidade do SUS, foi o Estado que apresentou o maior incremento percentual em seus números de homicídios entre 2000 e 2012 no país – Estado este que apresenta déficit de mais de 2 mil vagas, com população carcerária acima dos 4.200 presos.

Se fossemos citar exemplos aqui encontraríamos graves lacunas em todos os estados da federação.
A maior parte dos presos no Brasil, respondem a penas que variam entre 4 e 8 anos de prisão, o que corresponde, em média, a 30% das penas. Em torno de 55% deles encontram-se na faixa etária dos 18 aos 29 anos de idade – idade produtiva – majoritariamente do sexo masculino, 94% para o ano de 2012. O que sugere políticas públicas específicas para este grupo. Mais de 60% dos detentos são negros/pardos, o que aponta para outras políticas públicas específicas em torno da raça-etnia. Do total de 549.786 pessoas detidas/presas (isso juntando aqueles dentro do sistema propriamente dito e os que estão sob custódia das polícias), 295.242 são negros/pardos, 47% dos encarcerados no Brasil.

A maior parte dos crimes cometidos/tentados, seguindo o que o Código Penal brasileiro regulamenta, é contra o patrimônio (49% dos casos), em segundo lugar os crimes ligados ao tráfico de drogas (25% dos casos) e em terceiro lugar os crimes contra a pessoa – homicídios, sequestros e cárcere privado – com 11,9% dos casos. Ou seja, roubos, furtos, tráfico de drogas, homicídios, estelionato e latrocínio são os crimes mais comuns.

Sabendo disto, o estado devia fazer melhor uso dessas informações. Pelo que parece, os dados do Departamento Penitenciário Nacional são pouco úteis para o aplicador/tomador de decisão das políticas públicas de segurança do Estado brasileiro. Por outro lado, verificamos a total falta de interesse político dos gestores públicos por causa do pequeno resultado eleitoral que isto proporciona.

Referência bibliográfica:

ADORNO, Sérgio e SALLA, Fernando (2007), "Criminalidade organizada nas prisões e os ataques do PCC". Estudos avançados USP. 21 (61)


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