O que aconteceu nas principais cidades colombianas para que as mesmas reduzissem suas taxas de criminalidade?*
(*Este
paper foi retirado de minha tese de Doutorado “Os Homicídios no Brasil, no
Nordeste e em Pernambuco: dinâmica, relações de causalidade e políticas
públicas”. 271 p. Pós-Graduação em Ciência Política da UFPE. Recife. Março de
2010. Pp. 158-181.)
José Maria Nóbrega – Doutor em Ciência Política pela UFPE e Professor
Adjunto II da UFCG
Introdução[1]
A Colômbia vem se apresentando como um exemplo
importante de ser analisado entre os países da América Latina. Levando-se em
consideração apenas duas cidades, Bogotá e Medelín, ali foram aplicadas uma
série de políticas públicas – preventivas e repressivas – apontadas como o
fator decisivo para a redução de suas altas taxas de homicídio desde, pelo
menos, finais da década de noventa. Contudo, a Colômbia permanece como um dos
países mais violentos do mundo, fator explicado pela ausência de políticas de
Estado a nível de todas as cidades colombianas (Cf. Tabela 1).
Tabela 1: Taxas de
homicídio na América Latina – 2002
País
|
2002
|
El Salvador
|
41
|
Colômbia
|
40
|
Honduras
|
41
|
Brasil
|
20*
|
México
|
18
|
Venezuela
|
33
|
Peru
|
5
|
Panamá
|
11
|
Equador
|
15
|
Argentina
|
5
|
Costa Rica
|
6
|
Uruguai
|
4
|
Paraguai
|
4
|
Chile
|
3
|
Fonte: Acero Velásquez
(2006). * Dado para este período segundo o SIM/MS foi de 28,5 hpcmh
Gaviria (2007 apud Sanchéz Torres) aponta para a
importância da política de segurança cidadã em Bogotá como fator importante
para a redução da violência. Baseado em Acero Velásquez
(2006) ela afirma que as políticas de Estado implementadas em Bogotá foram
fundamentais para o sucesso do controle da violência e, sobretudo, de suas
altas taxas de homicídio. Sem revelar dados ou alguma sustentação empírica para
tal tese defendida em seu artigo, Gaviria (2007 apud Sanchéz Torres) fala de
mudança cultural, ou melhor, da introdução de uma “cultura cidadã” como
elemento fundamental para a mudança de comportamento social e a respeito das
relações com as instituições responsáveis pelo monopólio da força naquela
cidade. A participação do prefeito na condução das políticas foi outro fator
colocado como determinante.
Seriam estas variáveis determinantes para a redução
dos altos índices de assassinatos em Bogotá? Houve uma real mudança cultural
que levou a mudança de comportamento social e institucional? Alguns autores
descartam veementemente explicações baseadas em reformas estruturais da
economia e de inserção social ou de viés cultural (Sánchez Torres, 2007).
1. Quais as principais variáveis
explicativas para a redução dos homicídios em Colômbia?
Sánchez Torres (2007) foi responsável por uma
coletânea de artigos que resultou em um livro intitulado Las Cuentas de la
Violencia , aí um grupo de estudiosos, a maioria de
formação econômica, abordaram o impacto de variáveis diversas de causalidade em
relação à violência na Colômbia com farto uso de ferramentas quantitativas.
Desmistificaram uma série de teses antropológicas/sociológicas que defendem
mudanças culturais ou estruturais (econômicas e sociais) como causas
determinantes para a redução da violência, inclusive os homicídios.
Quais fatores têm incidido para a redução dos
homicídios na região Andina? Sánchez Torres (2007) aponta para vários fatores,
mas destaca alguns que demonstram maior relação causal: a recuperação do
aparato de justiça, pois incrementou as taxas de detenções/aprisionamento em
cerca de 45% em 2005. O melhor funcionamento das instituições de fiscalização e
controle da violência e da segurança pública. Outro ponto foi o cerco aos
grupos paramilitares (milícias urbanas) e restrição de ação aos grupos
guerrilheiros, como as Farc[2]
(Sánchez Torres, 2007: 19-20). Isso refletiu na redução dos homicídios em
cidades como Bogotá e Medelín que tiveram redução expressiva (gráfico 01).
Gráfico 01. Homicídios
absolutos Bogotá e Medelín, 1994-2004
Fonte: Soares (2008:
164)
Divergindo de Posada (2006 apud Sánchez Torres, 2007)
e Gaviria (2007 apud idem, 2007), Sánchez Torres (2007) discorda veementemente
de uma possível “cultura da morte” ou o rótulo de que a Colômbia é um “país
assassino”. Argumenta o autor:
Es improbable que el “ethos
asesino” de los habitantes de la región andina se haya reducido a una cuarta
parte del prevaleciente en 1991. Tampoco tiene sustento empírico que la
desigualdad, la pobreza y la exclusión como “condiciones objetivas” se hayan
reducido en tan gran magnitud como para provocar semejante redución en la
violencia homicida en esta zona (2007: 20).
A generalização abordada por Posada é refutada quando
Sánchez destaca o crescimento da violência em outras regiões colombianas
mostrando quanto há de ligação entre debilidade institucional e recrudescimento
da atividade do tráfico de drogas e de grupos armados a margem da lei:
Muchas otras cidades del
Valle – por ejemplo: Buenaventura, Cartago, Palmira, Tuluá – experimentaron
drásticos incrementos en la violencia homicida, duplicando en algunos casos los
niveles de finales de la década pasada. Buenaventura ha sido el escenario de
actividad de grupos al margen de la ley que disputan un corredor estratégico
para el tráfico de drogas en su condición de puerto marítimo mientras que el
Norte del Valle sufrió la intensificación de la guerra entre los carteles de la
cocaína de esta región (Sánchez
Torres, 2007: 21).
Os argumentos de Sánchez (2007) caminham no sentido de
desmistificar teses estruturalistas e marxistas baseadas em discursos que ligam
a pobreza e a desigualdade, bem como a cultura de violência ou ethos assassino, como causas para a
violência, sobretudo os homicídios. Defende a tese na qual a debilidade
institucional somada ao incremento de atividades ilícitas, como o tráfico de
drogas e o plantio de coca, bem como a participação de grupos a margem da lei
(Farc, ELN e milicianos) são variáveis relacionadas ao crescimento ou redução
dos homicídios.
1.1 Os determinantes dos
homicídios na Colômbia
Os dados de homicídios em Colômbia apontam para
momentos de baixa e de pico desde meados do século XX. Em 25 anos, reportando a
meados da década de setenta, a taxa colombiana de homicídios era de 15
homicídios por cem mil habitantes. Durante os anos oitenta, período do ápice dos
cartéis de droga naquele país, a taxa de homicídios aumentou bruscamente até
alcançar um nível de cerca de 80 mortes desse tipo por cem mil. Essa tendência
vem se revertendo desde meados da década de noventa. Medellín e Cali alcançaram
picos de 380 e 160 homicídios por cem mil habitantes na década de oitenta,
respectivamente. Apesar dos dados apontarem características destacadamente
oscilantes de um período para o outro, boa parte da literatura questiona o ethos do colombiano para ser violento
(Sánchez e Méndez, 2007: 25).
A literatura contemporânea na Colômbia aponta para uma
maior sofisticação dos seus autores, sobretudo pela utilização de métodos
quantitativos sofisticados em suas análises. Gaitán (1995) utilizou métodos
estatísticos e de regressão e verificou que algumas hipóteses de estudos sobre
a violência que tinham como mote relacionar a violência homicida com a
desigualdade e a pobreza e o caráter colombiano violento, não se sustentavam ao
teste empírico dos dados. O trabalho de Gaitán (1995) revela-se como um grande
avanço nos estudos sobre as causas da violência em Colômbia, onde incluiu
mensurações em sete grandes cidades e municípios procurando avaliar o real
impacto das variáveis apontadas na literatura como causa para a violência.
1.1.2 A literatura colombiana
sobre as causas da violência homicida
A Comisión de Estúdios sobre la Violencia (1987) afirma
que a relação causal entre violência e desnível social e econômico,
desigualdade e pobreza é determinante. Esse diagnóstico foi sustentado com
escassa sustentação empírica e aponta que a redução da violência estaria
atrelada a um problema urbano que tem origem em causas objetivas perversas que
levariam os indivíduos ao crime e a violência desmedida[3].
Indo por outro caminho, Sarmiento (1999) fez um estudo
de caráter quantitativo onde avaliou as causas dos homicídios, utilizando, para
isso, dados de ordem municipal para os períodos de 1985-1988 e 1990-1996. As
variáveis independentes utilizadas no estudo foram o índice de qualidade de
vida, o coeficiente de Gini, a média de escolaridade da força de trabalho e a
taxa de participação eleitoral. A variável dependente foi às taxas de
homicídios.
Depois de dividir a amostra entre municípios com
violência crescente e com violência decrescente, o estudo demonstrou que a
violência está associada negativamente com o nível de educação e de
participação política, e positivamente com o nível de riqueza, principalmente
com a desigualdade medida através do coeficiente de Gini. De acordo com Sarmiento (1999) ha sido el factor más importante en los años
noventa para incrementarla.
O referido autor conclui que ao observar a evolução
das cifras da violência nos municípios estudados, a desigualdade aparece como
causa da violência. Outras variáveis como a concentração de riquezas e a débil
presença do estado tendem a reproduzir a violência, segundo este autor. O
trabalho de Sarmiento (1999) não introduz variáveis tais como a presença de
narcotráfico, medidas de ineficácia do aparato de justiça e ações dos atores
armados na dinâmica das taxas de homicídios, o que pode limitar
consideravelmente suas conclusões.
Bourguignon (2000), dentro da teoria das causas
objetivas, propõe que a pobreza e a desigualdade são causa e consequência da
violência, o que imerge as economias latino-americanas em um círculo vicioso
donde os fenômenos se auto reproduzem. O autor parte do modelo de Becker
(1968), pelo que incorpora variáveis de detecção do crime, honestidade,
pobreza, perda social e o efeito que a criminalidade exerce sobre a economia. O
autor inclui dentro do modelo a detecção do crime que depende da quantidade de
dinheiro destinado à prevenção e a luta contra o crime.
Para medir a perda social, Bourguignon (2000) utiliza
uma variável que depende do custo em que incorre o sistema de justiça criminal,
uma variável que mede os efeitos externos da criminalidade como a insegurança
do cidadão e os efeitos sobre a economia. O autor afirma que este modelo
funciona melhor para os crimes contra o patrimônio ou aqueles que tenham um
incentivo econômico definido e não para os crimes contra a vida, já que estes
não encontram uma motivação econômica comprovável em muitos casos.
Ao longo de seu trabalho, Bourguignon (2000) argumenta
que a criminalidade tem sua origem na pobreza e na desigualdade e mostra como
em países com altos níveis de crime e violência, um aumento na desigualdade
potencializa importantes perdas sociais. Não obstante, destaca que o modelo
pode não servir em um caso como o colombiano, pois nesse país existem variáveis
culturais peculiares que afetam de forma mais direta a criminalidade.
Sem uma sustentação empírica mais relevante para
sustentar suas hipóteses, Moser (1999) oferece um enfoque integrado que
incorpora as dinâmicas de diferentes tipos de violência. Para ela existem três
tipos de violência: a política, a econômica e a social. A violência política
relaciona os atos violentos com desejos de reter poder político, a violência
econômica define uma correlação entre os atos violentos e o desejo de obter
ganhos de poder econômico e a violência social atribui os atos violentos ao
desejo de ascender socialmente.
Moser atribui causas específicas para cada tipo de
violência pelo que estabelece uma base causal em que todas compartilham: a)
mínima presença estatal em territórios com altas taxas de violência; b)
inconsistência no manejo da política institucional da violência; c)
instituições que são e se percebem como altamente corruptas; d) uma sociedade
de baixos níveis de tolerância social e uma alta aceitação da violência como
meio para resolução de conflitos; e) uma alta fragmentação econômica, política
e social devida a heterogeneidade regional; f) um estado que delega parte de
suas funções a proprietários do poder local naquelas regiões donde sua presença
é limitada e a relação entre a violência rural e urbana. As hipóteses não foram
bem testadas, apesar de serem sugestivas.
Gaviria (2000) apresenta várias hipóteses para
entender as altas taxas de homicídios na Colômbia. Desenvolveu três tipos de
modelos em que se analisam as possíveis externalidades geradas entre criminosos
e a probabilidade de uma escalada da violência gerada de forma endógena. Cada
modelo apresenta uma explicação plausível acerca da reprodução do crime na
sociedade colombiana e podem ser considerados complementares, pois cada um
aporta elementos que contribuem averiguar a totalidade do fenômeno.
O primeiro modelo apresentado argumenta que os crimes
são alimentados pela ineficiência punitiva do aparato de justiça criminal, por
sua vez essa fragilidade institucional realimenta a delinquência. O segundo
modelo reforça a teoria do aprendizado social (CERQUEIRA e LOBÃO, 2004),
demonstrando que os conhecimentos criminais (know-how) de novas tecnologias potencializam a criminalidade. O
terceiro modelo se refere ao capital humano no sentido de que o contínuo
contato de jovens com experiências criminais/delinquentes “pervertem” a moral e
pré-dispõem esses jovens a práticas delituosas.
Gaviria (2000) conclui com essa análise que o crime
organizado, em particular dos narcotraficantes, é o responsável pela rápida
evolução da violência na Colômbia, desenvolvendo, também, novas tecnologias que
aumentam substancialmente o aprendizado criminal entre os jovens. Os
narcotraficantes estimulam a mudança comportamental nas comunidades as quais
dominam. E, em última instância, implica que o crime violento, sobretudo os
homicídios, esteja associado fortemente ao narcotráfico e fragmenta o capital
social (Fukuyama, 2000) propiciando uma escala de valores perversa, que será
admitida pela comunidade como sendo um comportamento moralmente aceitável o que
tenderá a perpetuar a violência.
Rubio (1999) marca uma ruptura entre os estudos sobre
a violência na Colômbia ao refutar mitos e lugares comuns presentes em diversos
estudos sobre o tema. A violência como fato fortuito, causado principalmente
por rixas, para o autor supracitado, é pertinente apenas para uma parte
reduzida dos homicídios em Colômbia, mais precisamente, nos lugares mais
pacíficos do país. Mostra com dados do departamento de Medicina Legal, que os
homicídios ocorrem em lugares com bons indicadores socioeconômicos, o que
indica que a criminalidade não esta condicionada a fatores de desigualdade e
pobreza. O autor argumenta que não é factível pensar que a violência seja
gerada por indivíduos “forçados a delinquir” pela pobreza, a desigualdade, a
falta de acesso ao mercado de trabalho e, de forma geral, uma situação pouco
favorável nessas circunstâncias.
Rubio mostra que as maiores taxas de violência estão
justamente nas cidades de maior desenvolvimento socioeconômico e com indivíduos
com maior acesso a educação e ao emprego e onde essas cidades acomodam maiores
confluências de organizações criminosas (guerrilha, paramilitares e narcotráfico).
Dessa forma, o autor afirma, baseado em dados, que nove de cada dez populações
com a maior taxa de homicídios em 1995 se reportaram a presença guerrilheira,
em sete de cada dez se reportaram a presença de narcotráfico e um pouco menos,
presença de grupos paramilitares (semelhante as milícias no Brasil). 93% dos
homicídios registrados em Colômbia no ano de 1995 ocorreram em cidades onde se
teve a presença marcante de alguma das três organizações criminosas.
Rubio (1999) também aponta a ineficiência da justiça
penal como ponto importante no robustecimento da criminalidade violenta. O
congestionamento de despachos e processos contribui para a impunidade, bem como
a ineficácia da polícia em proceder com as investigações. Baseado em dados do
sistema de justiça e da polícia, Rubio chega as seguintes conclusões sobre as
causas da criminalidade violenta em Colômbia:
- O deficiente desempenho da justiça penal tem
incentivado os crimes e corroborado para o aumento do comportamento
violento;
- Os fenômenos violentos, propiciados por
grupos armados, tem contribuído para a paralisia do sistema penal mediante
pressão direta e indireta dos atores dessas organizações sobre o sistema
de justiça colombiano.
Echandía (1999) proporciona um trabalho que apresenta
um seguro aporte empírico. Oferece uma análise que busca entender a
distribuição geográfica da violência com um possível suporte de variáveis
explicativas para isso. Segundo Echandía os municípios com elevados índices de
violência não se encontram dispersos por todo o território colombiano, mas sim
fazem parte de um conjunto que cresce na medida em que crescem os atores que
promovem a violência. O autor argumenta que existe uma alta correspondência
entre altos índices de violência e a presença de organizações armadas ilegais.
Dessa forma, dos 342 municípios com elevadas taxas de homicídios, 284 (83%) tem
presença da guerrilha, enquanto 152 tem a presença de grupos paramilitares. A
presença de tais atores armados por si só não é a causa única das altas taxas
de violência, pois a simples presença deles fragiliza o sistema de justiça
penal que fica congestionado pelas pressões diretas e indiretas desses atores,
desqualificando o processo punitivo, aumentando a impunidade.
A maioria dos trabalhos aqui analisados apresenta como
principal argumento a relação/associação/correspondência entre as taxas de
violência e criminalidade (Proxy=homicídios) com a presença de grupos
criminosos e a ineficiência do aparato coercitivo, enquanto os aspectos
estruturais são colocados em segundo plano. Essa literatura reforça o papel do
estado (e suas políticas públicas em segurança) como principal aspecto para a
redução da criminalidade e da violência a curto e médio prazo.
1.1.3 Os determinantes das taxas
de homicídios nas grandes cidades colombianas
Sanchez e Méndez (2007) elencaram algumas variáveis
independentes para testar as taxas de homicídios (variável dependente) nas
principais cidades colombianas e suas regiões metropolitanas. Utilizando técnica de regressão estimada em Mínimos Quadrados
Ordinários avaliaram o impacto do Coeficiente de Gini, a
percentagem de lugares pobres e a população da cidade (variáveis de caráter
socioeconômico) e, também, a densidade do narcotráfico, a ineficiência na luta
contra o narcotráfico e a taxa de prisões por homicídios (variáveis
institucionais) em relação às taxas de homicídios (Cf. tabela 2).
Tabela 2. Determinantes das taxas de
homicídios em sete cidades principais colombianas
Variáveis
|
Regressão-1
|
Regressão-2
|
Regressão-3 WTLS
|
constante
|
-0,685
|
-1467***
|
-0,116
|
Variáveis socioeconômicas
|
|||
Gini
|
-0,734**
|
-1026***
|
-0,846
|
% lugares pobres
|
0,148
|
-0,014
|
0,339*
|
População
|
0,048***
|
0,079***
|
|
Variáveis de justiça e narcotráfico
|
|||
Densidade do narcotráfico
|
0,139***
|
0,181***
|
0,075**
|
Ineficiência na luta contra o
narcotráfico
|
0,039*
|
0,052
|
|
Taxa aprisionamento homicídios
|
-0,093***
|
||
R2
|
0,83
|
0,812
|
-0,878
|
N
|
147
|
105
|
105
|
Fonte: Sanchez e Méndez (2007: 45).
Os resultados dos autores mostram que o efeito do
Coeficiente de Gini sobre a taxa de homicídios nas grandes cidades é negativo,
ou seja, a relação é inversa. Quanto mais distribuição de renda, mais
violência. O que se choca com boa parte da literatura sociológica (Beato e
Reis, 2000). Por outro lado, a linha de pobreza tem efeito esperado
estatisticamente, apesar de não ter grande significância. Não houve relação
entre variáveis de mercado de trabalho, como emprego e salários, e as taxas de
homicídios.
A variável densidade do narcotráfico tem sinal
esperado sobre a taxa de homicídios sendo, dessa forma, altamente
significativa. Assim, um incremento de 1% na renda por narcotráfico per capita
incrementa a taxa de homicídios em 0,18%. A ineficiência no combate ao
narcotráfico, que os autores apontam como sendo ao mesmo tempo uma variável que
mede a eficácia da justiça, apresentou sinal esperado sobre as taxas de
homicídios. Dessa forma, um incremento percentual de 1% no valor desta variável
incrementa a taxa de homicídios em 0,03%. O efeito da população sobre as taxas
de homicídios apresentou-se positiva, como se espera alguns estudos sobre
violência e crime e demografia (Mello e Schneider, 2009). Assim, se a população
aumenta em 1% a taxa de homicídios sofrerá incremento de 0,07%.
Avaliando o choque das variáveis independentes
apontadas em relação ao incremento nas taxas de homicídios, Sanchez e Méndez
(2007) apontam que mais de 90% da explicação para tal incremento nas taxas está
ligada a renda proporcionada pelo narcotráfico. A ineficiência da justiça não
chega a 5% e a pobreza mesmo a 1%. Analisando o impacto de diversas variáveis
independentes em relação aos homicídios nos municípios colombianos, os autores
chegaram a algumas conclusões importantes:
- A presença de atores armados (FARC) se
mostra relacionada positivamente com as taxas de homicídios. Os resultados
dos modelos econométricos mostram que um incremento da presença desses
grupos por cada dez mil habitantes aumenta as taxas de homicídios em 1,8 e
4,2;
- A densidade do narcotráfico, medida pela
renda proporcionada de forma per capita, tem um efeito positivo sobre as
taxas de homicídios;
- A ineficiência no combate ao narcotráfico (Proxy de taxa de impunidade),
medida pela renda do narcotráfico sobre prisões por este delito, tem um
efeito positivo sobre as taxas de homicídios. Um incremento de um ponto
neste indicador eleva a taxa de homicídios entre 4,4 e 9,4 pontos. Este
resultado implica que a ineficiência da justiça, ao diminuir a
probabilidade de punição, incide positivamente sobre o crime. As
interações entre atores armados e a intensidade do narcotráfico constituem
uma mescla que exacerba a violência. Assim, um aumento de um ponto no
indicador de interação entre a FARC com o narcotráfico eleva as taxas de
homicídios em 0,41, enquanto o aumento de um ponto na interação ELN e
narcotráfico aumenta em 0,75 as taxas de homicídios;
- Uma maior cobertura educacional diminui as
taxas de homicídios. E a presença de outros grupos guerrilheiros também
incrementa as taxas de homicídios.
Sánchez e Méndez (2007) inferem afirmando que a
investigação sobre a violência em Colômbia obedece a características especiais
originadas na existência de grupos armados, atividades ilegais, ineficiência da
justiça e nas diversas interações entre estas variáveis. A pobreza, a
desigualdade e a exclusão social não produzem em Colômbia uma violência
diferente da que pode produzir em outros países ou regiões. Neste sentido, a
solução para os problemas de precários níveis de vida, de acesso aos serviços
sociais e de baixa participação e representação política de muitos grupos
sociais é um objetivo desejado do ponto de vista de políticas públicas e se
deve lutar por isso. Não obstante, ligar o desaparecimento dos problemas da
violência a superação dos problemas relacionados a pobreza, desigualdade e
exclusão é uma estratégia equivocada a luz da evidência empírica apresentada em
suas investigações aqui resumidas.
2. As políticas públicas em Bogotá e
Medellín
Bogotá e Medellín apresentam-se como casos exitosos na redução de suas
altíssimas taxas de homicídios. Em meados da década de noventa os números
absolutos de homicídios em Medellín superavam os 5.200, enquanto em Bogotá
superava os 3.600, com taxas por cem mil que superavam 250 e 80
respectivamente. Em matéria publicada pela revista Veja em junho de 2000 o
seguinte título ilustrava o caso colombiano: “Na Colômbia o crime já venceu”. Bogotá e Medellín como duas
cidades de domínio quase que irrestrito dos cartéis da droga e dos grupos
guerrilheiros.
Em 2000 era essa a realidade colombiana:
Nosso vizinho mais violento atingiu um padrão de criminalidade sem
precedentes, a ponto de 40% do território do país estar entregue a
narcotraficantes, paramilitares e aos guerrilheiros das Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia (Farc), um fóssil venenoso da Guerra Fria. Como
conseqüência desse processo de ocupação, estima-se que quase 2% da população –
800.000 pessoas – tenha abandonado o país nos últimos dez anos com medo da
violência. Calcula-se que 1,5 milhão de camponeses fugiram da violência no
campo para engrossar as favelas das grandes cidades. Um terço desse total está
na capital, Bogotá. É o terceiro maior número de refugiados internos no mundo.
Só perde para Angola e Sudão (Lores, 2000).
A Colômbia continua sendo um país extremamente
violento. Mas, o que levou essas duas cidades colombianas a derrubarem tão
expressivamente seus indicadores de violência? Seguindo a tese de Sanchéz
TORRES et ali (2007), o trabalho intenso
no combate ao narcotráfico, aos grupos guerrilheiros e aos grupos paramilitares
foi ponto chave nas políticas públicas de Bogotá e Medellín. Políticas
preventivas parecem ter tido algum efeito, não obstante poucos estudos com
algum grau de sofisticação empírica (Acero Velasquéz, 2006).
Soares (2008) assim avalia os resultados obtidos nessas duas cidades
colombianas:
a.os dados sobre Bogotá demonstram
que, quando uma política pública acertada passa de política de governo a
política de Estado, há benefícios evidentes, há continuidade. O número absoluto
de homicídios decresceu ano a ano entre 1994 e 2004, de 3.664 para 1.571.
b. o mesmo é válido para Medellín,
uma experiência menos conhecida que a de Bogotá, e que reduziu ainda mais o
número de homicídios, de 5.284 para 1.517 no mesmo período; porém, a redução
não foi linear, nem por amplo período, como em Bogotá: houve uma redução
modesta de 1994 a
2002 e uma grande baixa de 2002 para 2003 e desse ano para 2004, o que leva o
analista a suspeitar de que houve pelo menos dois conjuntos de políticas, um
moderadamente exitoso e outro muito exitoso; outro conjunto de dados também
mostra um decréscimo acelerado, mas os momentos variam. O estudo de Cardona e
outros (2005), mostra um acelerado descenso das taxas de homicídio em Medellín,
de aproximadamente 375 em 1992/1993 para pouco mais de 150 em 1998/1999, uma
das maiores reduções da história do crime. É preciso não esquecer que, em
Medellín, o confronto entre os narcorrevolucionários e os para-militares foi intenso
(ib idem, 2008: 163-4).
É evidente a defesa da tese das políticas públicas de
segurança por parte de Soares (2008), o que não fica evidenciado em termos de
dados mais consistentes para a defesa de tal argumentação. Não obstante,
sabe-se que os trabalhos executados por Sánchez e Méndez (2007) – visto
resumidamente nas seções anteriores -, sustentam a presença do estado como
fator determinante para a redução das elevadas taxas de homicídios em diversos
municípios colombianos, principalmente no confronto as narcoguerrilhas.
Hugo Acero Velasquez (2006) reforça a tese das
políticas públicas de segurança como fator determinante para a redução da
violência em curto espaço de tempo. Baseado em um conceito de segurança cidadã
(ONU-PNUD), esse autor aponta para as políticas bem sucedidas em Bogotá e
Medellín. A importância da sequência das políticas em Bogotá, num curso de nove
anos, é colocada como ponto nevrálgico no sucesso dessa cidade colombiana no
confronto da criminalidade e da violência. Um programa unificador, o Programa Departamento e Municípios Seguros, de
caráter nacional, amplia o papel da polícia nacional em parceria com os
Ministérios do Interior e da Justiça e de Defesa na elaboração das estratégias
a serem seguidas nas diversas localidades.
Velasquez (2006) destaca o fracasso das políticas de
segurança numa perspectiva histórica, ressaltando o papel pouco democrático das
instituições coercitivas que utilizavam de métodos repressores sem a
implementação de políticas preventivas em suas conjunturas. A ausência de
estratégias, gestão e cumprimento de metas aliadas a uma política de segurança
cidadã estariam na raiz dos problemas relacionados às políticas públicas de
segurança em Colômbia.
Nos dizeres de Velasquez (2006):
Esta falta histórica de gestão estatal da segurança e, de maneira
particular, da segurança cidadã, foi refletida na obscuridade com relação ao
conceito e à gestão da ordem pública, a qual é equiparada comumente aos
problemas do conflito armado e não ao conceito de ordem do público, que pode
ser alterada não apenas por ações de grupos armados à margem da lei, mas também
por ações do narcotráfico, da delinqüência organizada e comum, bem como por
atos de corrupção (ib idem, 2006: 188).
Bogotá é um exemplo de caso exitoso onde suas políticas
de segurança de gestão local da convivência e da segurança cidadã seriam os
motivos para tal êxito (Acero Velasquez ; 2006). O autor defende o argumento no
qual os homicídios foram reduzidos em Bogotá tendo como principal causa as
políticas de segurança cidadã que foram implementadas pelos prefeitos Antanas
Mockus e Paul Bronberge (1995-1997), Enrique Peñalosa (1998-2000) e, novamente,
Antanas Mockus (2001-2003). Tais gestores assumiram a gestão dos problemas de
segurança e convivência, cumprindo as disposições da Constituição[4]
e legislação vigente. A partir de 1995 a Administração Distrital elaborou e
implementou um plano integral de segurança e convivência, além das funções de
controle das atividades delitivas por meio do uso legítimo da força coercitiva,
executou uma série de programas orientados à prevenção e à melhoria da
convivência cidadã. Velasquez afirma que esse plano foi responsável pela
redução dos índices de homicídios na cidade de Bogotá, que passou de 4.352
homicídios em 1993 para 1.582 em 2004.
No entanto, Velasquez (2006) aponta para vários
projetos, baseados em estudos científicos, que foram executados na cidade de
Bogotá e que vieram a fortalecer a segurança pública e a melhorar os espaços
públicos, dessa forma, diminuindo a violência e a criminalidade. Baseado em
sete pontos, esses projetos tiveram várias perspectivas, invadindo o espaço
público e efetivando políticas públicas coerentes e que buscam cumprir metas.
Os sete pontos: 1. Gestão institucional do município; 2. Informação confiável
(a importância dos dados estatísticos); 3. Plano de segurança e convivência; 4.
Criação de infra-estrutura administrativa e destinação de recursos humanos,
técnicos e financeiros; 5. Fortalecimento da Polícia Metropolitana; 6.
Prestação de contas, avaliação e acompanhamento (accountability); e 7. Avaliação externa.
No espaço aqui, vou ser arbitrário elencando alguns
projetos que se mostraram importantes para o combate a violência e ao crime
nessa cidade e que tem algum dado que possa lhe dar alguma sustentação. Os
programas serão elencados de acordo com os sete pontos relevados acima:
- Gestão institucional do município[5]:
Desde 1995 os prefeitos
assumiram a liderança e a coordenação da política pública de segurança cidadã
da cidade. O decreto 2.615 de 1991 organizou os Conselhos Departamentais de
segurança. Criou os Conselhos Regionais de Segurança e os Conselhos
Metropolitanos de Segurança, facultando aos governadores a autorização de
Conselhos Municipais de Segurança, também criando os Comitês de ordem pública.
Esses conselhos são compostos pelo Prefeito, o Comandante da Guarda Militar, o
Comandante da Polícia, o diretor seccional do Departamento Administrativo de
Segurança (DAS), o delegado do Procurador Geral da Nação, o diretor Seccional
de Ordem Pública e Secretaria de Governo.
Essa estrutura permitiu
que fosse dada prioridade à proteção da vida e que fossem levados a cabo
projetos que melhoraram a convivência, a segurança e a coordenação
interinstitucional. O Conselho de Segurança da cidade, que engloba todas as
instituições formalizadas pelo decreto 2.615 acima delineado, teve
funcionamento mensal. Tal conselho foi ampliado, mantendo reuniões a cada três
meses, onde passou a ter a presença de dezenove comandantes de postos
policiais, os comandantes das unidades especiais da Polícia Metropolitana de
Bogotá e algumas entidades do Distrito – dentre elas as Secretarias de Saúde,
Educação e Trânsito e o Instituto Distrital de Cultura e Turismo.
O trabalho em conjunto,
provocado sob o novo desenho institucional, gerou cooperação entre as entidades
e as instituições envolvidas, fazendo com que o mecanismo de gestão tivesse uma
racionalidade mais efetiva em termos de políticas de segurança que levassem em
consideração a conjuntura local.
- Informação confiável:
Como vem se
apresentando em diversas áreas das políticas públicas e de gestão, a informação
e os dados estatísticos se tornaram mecanismo imprescindível para a aplicação
de políticas e de recursos públicos. Saber da realidade sem dados é
praticamente impossível aplicar políticas públicas. Dessa forma, a informação
passou a ser de fundamental importância para a aplicação das políticas públicas
de segurança na cidade de Bogotá.
Sem informação
detalhada dos atos de violência e delinquência, afirma Hugo Acero Velasquez,
era muito difícil realizar análises, tomar decisões e avaliar as ações
executadas para o enfrentamento dos problemas de segurança e de cidadania.
Dessa forma, foi criado o Sistema Unificado de Informação de Violência de
Delinquência (SUIVD), com informação da Polícia Metropolitana e do Instituto
Nacional de Medicina Legal. Daí, a partir do SUIVD, desenvolveram-se estudos e
diagnósticos de violência e insegurança, o que permitiu conhecer as
problemáticas e planejar ações focalizadas.
- Plano de segurança e convivência:
A partir de 1995 foi
colocado em execução um plano de segurança e convivência com projetos,
programas e recursos voltados a fortalecer a ação da Polícia Nacional e das
autoridades de justiça e a prevenir os atos de violência e delinquência que
afetavam a segurança e a convivência dos cidadãos. Esse plano não descartou a
atuação coercitiva do aparato de justiça, mas deu relevância, também, a uma
cultura cidadã e de limitações de espaços propícios a comportamentos
incivilizados.
A justiça mais próxima
ao cidadão, com a implementação de programas de justiça alternativa,
objetivando a solução pacífica e célere de conflitos entre particulares e no
interior dos lares. Com o fortalecimento da justiça punitiva os conflitos
tenderam a diminuir. O fortalecimento das delegacias de família foi um ponto
importante citado por Velasquez como contraponto ao combate a violência,
sobretudo aquela interna aos ambientes familiares. A formação de mais de dois
mil e quinhentos líderes comunitários que se converteram em mediadores
comunitários e a ligação da justiça nesse sentido, apresentaram-se como
políticas importantes.
A punição foi refletida
no aumento das prisões e detenções. A Procuradoria Geral da Nação, o Instituto
Nacional de Medicina Legal, a Polícia Metropolitana e de Trânsito e a Inspeção
de Polícia, passaram a trabalhar em conjunto e com políticas alinhadas nesse
sentido. A Procuradoria e a Medicina Legal definindo de maneira rápida a
situação de pessoas indiciadas, a Unidade Permanente de Justiça (UPJ), órgão
que abrange as instituições aqui destacadas, quando passou a funcionar em seus
dois primeiros anos conseguiu colocar à disposição da justiça mais de 30 mil
pessoas que haviam cometido delitos. Igualmente, puniu-se com prisão
provisória, mais de 150.000 infratores, dos quais foram apreendidas armas de
fogo e instrumentos perfuro-cortantes. Nessa direção, foi ampliada a capacidade
da Cadeia Distrital de Bogotá que passou de 450 lugares para 1.100, com
instalações modernas. Nessa cadeia foi implementado um programa de
ressocialização que se afasta das concepções tradicionais, no sentido de
humanizar o detento. Com tais programas, foi reduzida a violência nas
penitenciárias de Bogotá, onde, nos últimos seis anos foi registrada apenas uma
morte violenta (suicídio) no âmbito do sistema. Contrastando significativamente
com outras unidades prisionais fora de Bogotá, onde muitas apresentaram
centenas de homicídios por ano.
O foco na variável
juvenil é outro ponto de tais políticas. A atenção de políticas públicas de
prevenção e educação aos jovens em situação de risco. Se baseando na teoria das
janelas quebradas (Kelling e Coles, 1997), o Programa Missão Bogotá centralizou
sua intervenção na recuperação de espaços degradados no intuito de melhorar a convivência
entre os usuários desses espaços. Alguns moradores de rua foram transformados
em “Guias Cívicos”.
O programa Renovação
Urbana teve como intuito renovar esses espaços, combatendo comportamentos
incivis e limpando esses lugares de práticas delitivas e delinquentes, como o
tráfico e o consumo de drogas e de álcool.
Ponto importante diz
respeito ao fortalecimento da investigação criminal. Em conjunto com o Departamento
Administrativo de Segurança (DAS), a Procuradoria Geral da Nação, o Instituto
de Medicina Legal, a SIJIN[6]
e a DIJIN[7]
da Polícia Nacional, desde 2002, foram realizados, no campo da investigação
criminal, diversos cursos de atualização dos conhecimentos da polícia
judiciária e de padronização dos procedimentos de polícia para a inspeção do
lugar de comissão dos atos delitivos, buscando prover os Promotores com maiores
elementos para iniciar uma investigação e levá-la a cabo em bons termos. Apesar
do reforço colocado pelo autor, não foi disponibilizado dados quantitativos
dessas investigações para o fortalecimento de seu argumento[8].
- Criação de infra-estrutura administrativa e destinação de recursos
humanos, técnicos e financeiros:
Em 1997 foi criada a Subsecretaria de Assuntos para a Convivência e para
a Segurança Cidadã, submetida à Secretaria de Governo. Essa subsecretaria
contou com recursos[9]
para o fortalecimento dos organismos de segurança e justiça. Essa instituição
conta com três diretorias, a Diretoria de Direitos Humanos e Apoio à Justiça, a
Diretoria de Segurança e a Diretoria de Cadeia Distrital. Segundo Velasquez,
esse novo desenho institucional garantiu o processo de institucionalização
continuada da gestão em segurança cidadã.
- Fortalecimento da Polícia Metropolitana:
Em Colômbia houve um
forte investimento na área de segurança, as administrações distritais
aumentaram significativamente o orçamento para fortalecer as instituições
policiais. Passou-se de 12.157 milhões de
pesos investidos pela administração de Jaime Castro (1992-1994) a 49.533
milhões no primeiro governo de Antanas Mockus (1995-1997). A administração de
Enrique Peñalosa investiu 116.107 milhões (1998-2000) e o último governo de
Antanas Mockus investiu 111.605 milhões de pesos (2001-2003) (Acero
Velasquez, 2006: 200).
Com a implementação
crescente desses recursos foi possível executar várias estratégias nas áreas de
comunicações e mobilidade[10],
infra-estrutura, fortalecimento do talento humano[11],
participação comunitária[12],
gestão do trânsito, Polícia Comunitária[13],
menor número de policiais para a administração e maior para a vigilância e as
zonas seguras.
Nesse penúltimo ponto
das estratégias conta um dado importante: o aumento do efetivo fazendo trabalho
de rua[14].
Com isso, o dado exposto por Velasquez demonstra, apesar de frágil em termos
quantitativos, que a maximização de policiais por habitante é fundamental. O
autor afirma que hoje mais de 1.500 policiais que faziam tarefas burocráticas
foram designados para tarefa de vigilância e segurança externa.
No que tange as zonas
de segurança, foram definidas 28 quadras da cidade como pontos estratégicos
para a aplicação da vigilância e da segurança cidadã. Foi inspirado no modelo
de “equipes do bairro” que é utilizado pela Polícia Comunitária e de
Proximidade, da Espanha. Esse programa é mais uma tarefa conjunta das
autoridades Distritais, com a Polícia Metropolitana e o setor privado, já que
as zonas são especialmente em áreas comerciais de alto fluxo de pessoas.
- Prestação de contas, avaliação e acompanhamento (accountability):
Apesar de afirmar que
há uma prestação de contas, accountability, por parte da gestão, não há uma
clara dimensão das informações no documento elaborado por Hugo Acero Velasquez.
Contudo:
Com base nas análises da informação do Sistema Unificado de Informação
de Violência e Delinqüência (SUIVD), bem como nas investigações e reuniões
periódicas interinstitucionais, fazia-se acompanhamento e avaliação. Os
resultados da política de segurança eram avaliados, pelo menos uma vez ao mês,
pelo Conselho Distrital de Segurança, presidido pelo Prefeito Maior e com a
participação do Comandante da Polícia Metropolitana, o Promotor Seccional, o
Vice-procurador da nação e outras autoridades de segurança e justiça.
(Acero Velasquez, 2006: p.203).
- Avaliação externa:
O setor privado, a imprensa e a sociedade civil acompanham os
direcionamentos dos planos de segurança da cidade. Há a afirmação de uma série
de pesquisas de vitimazação que acompanharam a percepção do cidadão de Bogotá,
que demonstra satisfação da sociedade com os planos de segurança da cidade. Não
obstante, não fora citada tais pesquisas para uma possível avaliação.
Medellín teve um caráter diferente de Bogotá, pois ali
os cartéis da droga, os guerrilheiros urbanos e os grupos paramilitares foram fatores
determinantes para a escalada da violência nos anos noventa (Sanchéz et al, 2006; Soares, 2008). A superação
do conflito armado urbano e a aposta na segurança cidadã foram colocadas como
variáveis determinantes por Acero Velasquez (2006) em seu documento ao PNUD.
Dessa forma, em agosto de 2002 foi tomada a decisão de
intervir em um dos setores em disputa pelos grupos armados ilegais e no qual
predominava as guerrilhas das FARC, a chamada comunidade 13. A participação do
prefeito juntamente aos organismos de segurança e justiça foi imprescindível
nesse programa. Após a intervenção das diferentes agências de segurança e
justiça do estado, a comunidade passou a registrar 173 homicídios no ano de
2004, em contraposição a 717 registrados em 2003. O uso legítimo da força
marcou o começo do retorno da institucionalização dos territórios dominados
pelos grupos guerrilheiros, delinquentes e paramilitares.
O fortalecimento da Polícia Metropolitana foi
fundamental para se fazer presente junto as comunidades, que sofriam (e ainda
sofrem) da desconfiança em seus agentes. A presença constante desse aparato nas
comunidades criou espaços interinstitucionais de justiça, aproximando o cidadão
para alternativas de solução de conflitos e de programas diversos de prevenção,
fortalecendo a confiança e accountability
nas polícias. Com isso, lugares que até então a polícia não conseguia entrar,
passou a ter rondas de policiais patrulhando aqueles locais[15].
Sendo assim, o fortalecimento do aparato coercitivo e
a redução das atividades dos grupos fora da lei foram determinantes para a
redução da violência homicida na cidade de Medellín, que passou de uma taxa
superior aos 170 homicídios por cem mil habitantes em 2002, para uma taxa
inferior aos 60 em 2004. O que continua diminuindo. Portanto, a presença do
estado em espaços antes abandonados por ele e o confronto as incivilidades e
aos grupos criminosos, aumentam a confiança do cidadão nas instituições e vem a
fortalecer o estado democrático de direito.
Apesar das informações constantes das políticas
públicas de segurança em Bogotá e Medellín apontarem para um efetivo sucesso e,
mais, continuidade de gestão independentemente das mudanças políticas que mudam
os governos, não há uma consistência estatística para averiguar até que ponto
tais políticas foram determinantes para a redução da violência, sobretudo dos
homicídios, nas duas cidades. Contudo, há de verificar com os dados trabalhados
por Sanchez e Méndez (2007) que a eficácia do setor estatal aparece como ponto
balizador na redução dos homicídios, já que, além de ser responsável pela
prevenção da criminalidade e pela aplicação da punição, o aparato estatal de
segurança tem papel fundamental no confronto e desbaratamento dos grupos
guerrilheiros e de narcotraficantes que aparecem como a principal variável no
impacto dos homicídios em Colômbia.
Considerações Finais
Aqui foram levantados alguns pontos, importantes, a respeito do êxito
alcançado pelas duas principais cidades colombianas a partir de meados dos anos
noventa. Vimos que a análise minuciosa de dados e estudos científicos, com base
em dados minimamente confiáveis, é o que faz a diferença entre o sucesso e o
insucesso de politicas públicas de segurança. Tem pouco espaço para “achismos”
e ideologias materialistas de botequim.
Estes apontamentos aqui elencados podem e devem servir como parâmetro de
políticas públicas em segurança para os municípios nordestinos. Estes
atravessam graves crises de segurança e, o que é pior, são carentes de bons
gestores e de bons representantes em suas câmaras para fazer valer a ciência e
o desenvolvimento tecnológico como pontos fundamentais para a boa gestão da
coisa pública.
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[2]
Para uma visão histórica dos grupos guerrilheiros na Colômbia, sugiro a leitura
do livro La esquiva terminación del
Conflicto Armado en Colombia de autoria de Carlos Alfonso Velásquez Romero.
Editora Carreta Política. 2011.
[3]
Tendo como base teorias marxistas.
[4]
As disposições legais de segurança pública inseridas na Constituição de 1991 da
Colômbia afirmam ser de responsabilidade dos governos locais, municipais, a
questão da Segurança Pública. Para saber mais detalhes legais ler Acero
Velasquez (2006).
[5]
A literatura especializada vem apontando para o papel do município como ator
importante no confronto à violência e à criminalidade, por exemplo, em Khan e
Zanetic (2009) e Ferreira et al (2009).
[8]
Contudo, dados do DHPP de São Paulo e de Pernambuco mostram relação
significante entre produção de inquéritos e diminuição dos delitos (NÓBREGA JR,
2010 e 2012).
[9]
Dados dos recursos não disponíveis no documento original.
[10]
A modernização do CAD (Centro de Despacho automático) resultou em uma
diminuição substancial nas respostas às chamadas dos cidadãos. Passou-se de 20
minutos em média de resposta para 5 minutos. A partir de 1999, cada policial na
rua contava com um rádio de comunicação, o que facilitou o trabalho de
comunicação na policia. Antes, em 1995, foi iniciada a modernização e ampliação
do parque automotivo (Velasquez, 2006: 200).
[11]
A perspectiva apresentada era da melhoria intelectual do corpo policial. As
capacitações abordaram temáticas relacionadas aos direitos humanos, gestão pública
e privada, segurança e convivência cidadã, padronização de procedimentos,
dentre outros (Ib idem, 2006: 201).
[12]
O Comando da Polícia Metropolitana executou diversos programas especiais nesse
sentido. As Escolas de Segurança Cidadã passaram a capacitar líderes
comunitários para trabalharem de forma coordenada com as autoridades na
prevenção da violência e delinqüência. Mais de 26.000 líderes comunitários
foram formados nessas escolas. Em 1995 foram criadas as Frentes Locais de
Segurança, organizações de caráter comunitário que integram vizinhos por
diversos setores geográficos da cidade. Com essas frentes buscou-se o enfrentamento
ao medo e apatia que as diversas ações violentas e de delinqüência acometiam na
sociedade. Hoje existem mais de 7.000 dessas organizações (idem, 2006: 201).
[13]
Seu objetivo é aproximar a polícia da
comunidade e propiciar uma cultura de segurança cidadã no bairro ou setor
designado, por meio da integração entre administração local, a polícia e a
comunidade em busca da melhoria da qualidade de vida. Segundo um estudo
realizado no ano de 2000 pelo Instituto de Desenvolvimento Humano da Pontífica
Universidade Javeriana, 96,4% dos entrevistados afirmaram que a Polícia
Comunitária é uma alternativa eficaz na redução dos delitos e melhoria da
convivência cidadã (idem, 2006: 202).
[14]
Efetivos policiais por cem mil: Lisboa 43, São Paulo 382, Bogotá 147 e
Pernambuco 201 (PMs), para o ano de 2004. Dados em Acero Velasquez
(2006) e NÓBREGA JR (2010) Capítulo 3, página 114.
[15]
Em viagem recente a Bogotá, tive a oportunidade de ver isto na prática. As 3
horas da manhã, a Policia Nacional fazia rondas em bares e restaurantes em
zonas consideradas de risco na Cidade.
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