DESORGANIZAÇÃO SOCIAL, DELINQUÊNCIA E COMPORTAMENTO DESVIANTE

» FEIRA DE CARUARU


Patrimônio nacional entregue ao abandono

Publicado em 08.01.2011, Jornal do Commercio

Lixo, sobras de mercadorias e esgotos estourados tiram brilho da tradicional área de comércio, no Agreste. Carros e caminhões estacionados em locais proibidos afetam clientes do Parque 18 de Maio

Wagner Gil

Especial para o JC

CARUARU – Considerada uma das maiores referências do Nordeste e Patrimônio Imaterial do Brasil desde 2007, a Feira de Caruaru, cantada há mais de cinco décadas por Luiz Gonzaga, está entregue ao abandono. Ruas ocupadas por lixo, sobras de mercadorias, carros, motos e caminhões estacionados dificultam a vida de quem vai ao Parque 18 de Maio fazer compras. Instalada em uma área no Centro, o complexo abriga 18 pequenas feiras que deveriam ser divididas em setores como artesanato, ervas, calçados. Mas tudo está descaracterizado, inclusive alguns bancos de feira que se transformaram em verdadeiras lojas.

Também não é difícil encontrar restos de metralhas e ferros em vários setores. Como diz o refrão da música de Onildo Almeida, “A Feira de Caruaru tem tudo pra gente vê”. E, neste momento, muitas coisas ruins: esgoto estourado, carcaças de geladeiras abandonadas, vasos sanitários jogados nas ruas, carros e motos estacionados em local destinados aos pedestres. “Isso acontece porque aqui não há autoridade de trânsito”, disse o feirante Ivanildo Santos. “Não é de hoje. É muita desorganização e acaba atrapalhando nossos negócios”, completa Juvenal Santos.

Segundo comerciantes, a falta de cuidado afasta alguns feirantes tradicionais do local. “Saiu gente que tinha mais de 30 anos de trabalho aqui”, reclama o comerciante Ivanildo Santos. “Não vou negar, meu movimento de vendas caiu nos últimos anos”, completou o feirante João Andrade, conhecido como João Melancia.

Segundo eles, a quantidade de fiscais é pequena e não existe policiamento no Parque 18 de Maio. “Nunca vimos um guarda municipal por aqui. Você poderia me dizer o que eles fazem?”, indagou com tom de ironia, José Francisco Neto. “Está faltando ordem. Tem muita coisa errada aqui e nós não podemos falar porque corremos o risco de ser prejudicados”, completou.

Outro problema é a descaracterização da feira. Em vários pontos onde deveriam ser vendidos só um tipo de produto, existem diversos, principalmente importados do Paraguai, da China e de Taiwan.

FAVELIZAÇÃO

“Mas o problema não é só esse. Em boa parte do local, as calçadas estão sendo ocupadas por barracas fixas. Além de dificultar o acesso dos compradores, dá um aspecto de favelização à Feira de Caruaru”, disse o professor universitário Arnaldo Gomes. Para a dona de casa Ana Maria Leite, a invasão de calçadas é um grave problema. “Tem hora que a gente não tem nem por onde caminhar e uma visita à feira se torna muito cansativa pelo sobe e desce de calçadas.”

Os feirantes reclamam também da constante invasão de veículos. Em praticamente todas as ruas há carros estacionados, embora haja dois estacionamentos com cerca de mil vagas. “Cadê a prefeitura que não multa esses infratores?”, indagou a feirante Maria do Socorro.

A reportagem tentou encontrar em contato com o diretor de Feira e Mercados, major Paulo Sérgio, mas foi informada que ele assumiu há pouco mais de um mês e não estava autorizada a falar sobre o assunto. O secretário de Comunicação da prefeitura, Rui Lira, informou que o prefeito não falaria sobre o problema.

Área tomada por ladrões e traficantes


O tráfico de drogas é outro dos grandes problemas do Parque 18 de Maio, principalmente nas proximidades da Feira do Troca-troca, do Mercado de Farinha e da Casa da Cultura José Condé. “Geralmente, são adolescentes que vendem e fumam maconha e crack. Mas sempre tem algum adulto por perto orientando e fornecendo”, disse uma feirante que atua no setor de ervas há 35 anos e pediu para não ter seu nome revelado.

O consumo de drogas assusta os comerciantes. A reportagem esteve no local três vezes e em dias diferentes e flagrou grupos de cinco pessoas, no mínimo, fumando crack. Os viciados geralmente se escondem embaixo das pontes e passarelas que dão acesso à Rua São Sebastião. A maioria das pessoas que dependem da feira está assustada e tem medo de falar. “Quando alguém aparece na imprensa denunciando corre risco de ter seu banco queimado. Já tivemos, há alguns anos, até um incêndio provocado pelos marginais que atuam na feira de artesanato”, disse uma feirante temendo represálias.

A quantidade de assaltos também é crescente no Parque 18 de Maio. Dona de uma barraca de caldo de cana, dona Creuza Rodrigues, disse que no mês passado ela e o vizinho foram abordados por dois homens armados no mesmo instante. Ela afirma que viveu momentos de horror com uma arma encostada na barriga. “Um dos ladrões me rendeu enquanto o outro levou tudo de meu vizinho. Minha filha, que tem uma barraca na frente, quando percebeu o assalto esboçou uma reação e ele ameaçou atirar em mim. Fomos todos assaltados e ficamos sem dinheiro, celular e relógios”, disse a feirante de 51 anos. “Depois do assalto, chamamos a polícia, mas ninguém apareceu aqui até agora. Hoje mesmo (na última terça-feira) dia de Feira da Sulanca, nenhum policial passou por aqui”, completou outro feirante pedindo anonimato. 

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