Polícia, Política e Poder
José Maria P. da Nóbrega Júnior
Doutor em Ciência Política pela UFPE
Um dos temas de destaque no
cotidiano brasileiro é o da violência praticada, em muitos casos exagerada,
pela polícia brasileira. Alguns estudiosos do tema conectam essa violência a
uma questão cultural que remonta ao Brasil imperial. Outros falam da militarização
como obstáculo à modernização e democratização da Polícia. A maioria desses
estudiosos advém da Sociologia como campo de estudo da instituição policial,
poucos são os cientistas políticos que se detêm nesta difícil seara que é
tratar do grave problema institucional pelo qual passa as nossas polícias com
destaque à Polícia Militar. Aí é onde eu me situo, avaliando a Polícia como uma
instituição que depende da Política e de como esta controla, ou não, a Polícia
como instituição. Na falta de controle institucional, o que teremos é o
descontrole do Poder de polícia. Dessa forma, o desempenho da polícia estará
fortemente vinculado ao exercício da Política e, por sua vez, do Poder.
Passa pela qualidade da
democracia o funcionamento e a performance
(com o resultado que se espera) das polícias. Um país onde a sua Polícia não
sofre controle do Estado possivelmente terá altos índices de letalidade
provocados pela polícia, principalmente se esta anda armada. O controle da Polícia
e a permissão para o uso da força advêm da prerrogativa do Estado como
monopolizador da violência (legal). Mas, quem é o responsável pelo controle do
Estado? É aí onde entra a Teoria Democrática, o responsável pelo controle do
Estado é o governo eleito em eleições livres, limpas, pluripartidárias e
periódicas. Geralmente o que temos é a responsabilização da instituição
policial como se esta fosse desconecta do Estado e, por sua vez, da Política
que está por trás. O governo é eleito e deve ser responsável com a República.
Esta tem na Polícia o principal mecanismo coercitivo, quando a Polícia falha
como mecanismo coercitivo o que temos como resultado é o aumento da violência e
da criminalidade, inclusive dentro da própria Polícia. É um exercício árduo de
controle do Poder Político, que não está apenas na relação entre o Legislativo
e o Executivo, mas onde há poder envolvido.
Como já dito antes, muito se
fala em desmilitarizar a Polícia brasileira para que haja, como “num passe de
mágica”, a humanização desta instituição. No entanto, há, em outros países,
polícias militares ou militarizadas que não excedem sua força permitida –
entende-se como força permitida a ordem advinda do agente eleito pelo povo,
este é quem vai decidir o uso da força, pois esta é uma decisão de cunho
político -, como é o caso do Chile e da França.
Temos
pelo o menos três modelos de polícia no ocidente: 1. Modelo britânico: a Polícia nasceu da estrutura social, é civil e
desarmada; 2. Modelo francês: gendarmerie,
onde a Polícia nasceu do
estado, é militarizada e armada; 3. Modelo
americano: a polícia nasceu da estrutura social, é civil e a sociedade e a polícia
são armadas. No modelo brasileiro a polícia nasceu do estado, é militarizada e
armada, com a sociedade desarmada. Os três modelos acima delineados é o que se
mostra num ou noutro caso em países democráticos e semidemocráticos (para uma
discussão em torno do conceito de Semidemocracia, A Semidemocracia Brasileira: autoritarismo ou democracia? Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no
23, jan./abr. 2010, p. 74-141 http://www.scielo.br/pdf/soc/n23/05.pdf
de minha autoria).
Na
Inglaterra, na França e nos EUA, que seguem modelos diferentes e um deles é
militarizado, as Polícias não excedem sua força permitida. Então, podemos
aprioristicamente – digo isto porque ainda é preciso analisar mais
profundamente esta hipótese – afirmar que a simples desmilitarização não vai
resolver o problema da disfunção policial no Brasil, pois o problema é muito
mais Politico que institucional.
O caso do secretário de
segurança pública do Distrito Federal (DF), professor da UnB, reflete bem a
desconexão entre Política e Polícia. O secretário fora uma “rainha da
Inglaterra” na sua gestão, pois quem efetivamente controla a Polícia Militar do
DF é o comandante da PM e não o agente representante do Poder Executivo. Quando
da crise com os professores do DF o uso da força permitida foi excedido contra
os manifestantes em greve tudo sem a tutela do secretário que só ficou sabendo
do uso indevido da força policial pelos jornais (http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/secretario-de-seguranca-publica-do-df-pede-demissao/
).
Dessa forma, um estado só
pode ser efetivo no controle de suas polícias através de um governo que saiba
qual o modelo mais adequado para o controle social. Se o modelo é militar ou
civil parece pouco importar, pois o que vai importar mesmo é o controle
Político do Poder policial, se o governo for fraco na relação de poder com a
Polícia esta vai impor o seu conceito de uso da força, passando por cima do
Estado que não é controlado pelo Poder Político.
Sem o claro exercício do
Poder, não tem como implementar um modelo bem sucedido de polícia democrática. Uma
Polícia sem controle (accountability) é uma polícia que tudo pode fazer, pois
quem vai decidir sobre o uso da força é ela mesma e não o governo eleito
democraticamente. E aí, não vai fazer diferença se esta é militar ou civil.
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