Em defesa da democracia liberal
Por José Maria
Nóbrega – cientista político e professor da UFCG
A democracia liberal
está em crise? As democracias sólidas – que são minoria – estão em
esfacelamento? Para o filósofo Renato Janine Ribeiro, em seu ensaio intitulado
“Democracia: entre a mimese e a criação”,
publicado na Revista Cult, as respostas são positivas, ou seja, a
democracia nos moldes procedimentais liberais fracassou. Mas, eu pergunto:
baseado em que Janine Ribeiro afirma isto?
Partindo do seu pressuposto
teórico – que vincula a democracia ao desenvolvimento econômico -, o destacado
filósofo “uspiano” salienta que nos EUA e na França os modelos de democracia
ali existentes estariam em crise por que no primeiro imperou a “fraude” nas
eleições de W. Bush e no segundo, pelo número de votos que a sociedade francesa
deu a um indivíduo que repudia os direitos humanos. Ora, mas os direitos
humanos não é um componente liberal da democracia contemporânea? Outra questão:
há comprovação empírica da fraude ocorrida naquelas eleições norte-americanas?
Qual o ponto de partida teórico da democracia que Janine está analisando,
desenvolvimentista ou institucional?
Democracia pressupõe
eleições e estas, segundo Dahl, só ocorrem quando alguns requisitos são
preenchidos pelo regime político de determinado país. Tais requisitos são o que
chamo de componente liberal: liberdade de expressão, livre iniciativa,
liberdade de informação, de associação, liberdade de partidos políticos
disputarem eleições livres, alternativa de informação e etc. Dessa forma,
eleições são um aspecto da democracia
e não a democracia plena.
As instituições
importam e são responsáveis, juntamente com o comportamento responsivo de seus
atores políticos, pela estabilidade do regime político democrático. Num cenário
onde um ator político autoritário é eleito e as instituições são estáveis e
responsivas, dificilmente este ator político irá solapar o componente liberal o
qual deve ser protegido pelo estado de direito dos países de democracia plena.
Na França dificilmente a vontade de uma maioria se tornará TIRANIA DA MAIORIA.
O Brasil é apontado
como um país miserável pelo Janine. Discordo da sua afirmação. Apesar da
pobreza e da desigualdade ainda serem problemas sociais sérios no Brasil, houve
redução significativa da pobreza e o país vem evoluindo economicamente, gerando
mais empregos e elastecendo a sua classe média – com fartos dados que a isto
comprova. A democracia brasileira ainda não se consolidou devido às altíssimas
taxas de violência homicida e a falta de capacidade de garantir/proteger
direitos civis por parte de seu estado de direito. Contudo, eleições livres,
limpas, idôneas, pluripartidárias e periódicas para o Executivo e o Legislativo
ocorrem de forma sistemática e sem atropelos há mais de quinze anos.
O desafio das
democracias contemporâneas é garantir aos seus cidadãos, de qualquer etnia,
crença e/ou classe social, o acesso irrestrito a igualdade perante as leis e as
oportunidades de educação, saúde e segurança. Garantir os direitos humanos e o
devido processo legal. Promover pluralidade nas agendas decisórias, arrefecer a
corrupção e a criminalidade e envolver a maioria numa cultura livre,
multicultural e de competição saudável e de consumo responsável.
A democracia liberal
ainda é o melhor dos regimes políticos, independentemente das falhas
institucionais nos EUA, na França, no Brasil, ou em qualquer outra parte do
planeta. Na verdade, a democracia é um regime político – forma de governo e
sistema político – que abrange um conjunto de regras para a resolução dos
conflitos sociais sem a necessidade de derramamento de sangue. Fatores como a
cultura e a pobreza são facilmente contornados quando o estado democrático de
direito se faz presente e induz as pessoas a respeitar direitos individuais importantes
como: o direito à vida, a liberdade de escolha e da propriedade advinda com o
esforço do trabalho digno e honesto.
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